quinta-feira, 20 de maio de 2010

20* O que aconteceu entre 5 e 14 de outubro de 1582?

Porto Alegre Ano 4 # 1386

Abro com dois registros do dia de ontem. Um e outro de emoções antípodas.

A alegria de pela manhã ter participado do IX Simpósio Sulbrasileiro sobre ensino de Filosofia, que se realiza no Centro Universitário Metodista - IPA como debatedor do filme ÁGORA, que pretensiosamente acredito ter sido, como a edição de 8 de maio, as duas primeiras exibições públicas em Porto Alegre. Houve a satisfação de encontrar um público que prestigiou os debates com contribuições muito significativas. Foi bom também ter colegas que desconhecia de outros estados do Brasil que usam A Ciência através dos tempos como livro texto em suas aulas de História e Filosofia da Ciência.

A tristeza de estar com a Gelsa, à tarde, nas cerimônias fúnebres de sepultamento da tia Amália, às vésperas de celebrar 92 anos. Ela fora casada com tio José um dos irmãos do pai da Gelsa. Há 20 dias no mesmo cemitério sepultávamos a dia Rosa, irmã do pai da Gelsa. Ter podido abraçar a Aidê e a Jane, que eram sofridas foi o meu acompanhar a dor da Gelsa. A cena mais comovente foi ver a Tatiana, a poucas semanas de dar a luz à Luiza que será a primeira bisneta que a Tia Amália sonhava embalar. As fotos são última visita que a Gelsa e eu lhe fizemos. Agora só restam evocações e estas são muito boas.

Assim, na dicotômica marcação de dias como mel ou como fel , ontem foi agridoce. Ou, como disse o simpático taxista que me levou ao velório: o equilíbrio entre vida e morte, pois quando lhe disse o meu destino, ele lembrou que acabara de deixar um casal na maternidade do Hospital Fêmina para um parto. Poderia ainda falar que à noite se preanunciava azul ao final do primeiro tempo, mas, não deu. Mas já há espaço demais onde se fala de futebol e esse blogue quer fugir do assunto.

Trago hoje aos meus leitores uma questão: o que aconteceu na história da humanidade, pelo nosso calendário, no período de 5 a 14 de outubro de 1582?

No nosso calendário – o gregoriano –: nada, pois esses dias não existiram. Por isso acentuei ‘nosso’ calendário.

O calendário gregoriano é o calendário utilizado na maior parte do mundo, e em todos os países ocidentais; porém, existem países que não o aplicam como a China, Israel, Iran, Índia, Bangladesh, Paquistão, Argélia etc. Foi promulgado pelo Papa Gregório XIII a 24 de fevereiro do ano 1582 para substituir o calendário juliano.

Gregório XIII reuniu um grupo de especialistas para reformar o calendário juliano e, passados cinco anos de estudos, foi elaborado o calendário gregoriano, que foi sendo implementado lentamente em várias nações. Oficialmente o primeiro dia deste calendário foi 15 de outubro de 1582.

Corrigiu-se a medição do ano solar, estimando-se que este durava 365 dias solares, 5 horas, 49 minutos e 12 segundos, o equivalente a 365,2425 dias solares.

Acostumou-se a começar cada ano novo em 1 de Janeiro.

A mudança para o calendário gregoriano deu-se ao longo de mais de três séculos. Primeiramente foi adotado por Itália, Portugal, Espanha e França; e de modo sucessivo, pela maioria dos países católicos europeus. Os países onde predominava o luteranismo e o anglicanismo tardariam a adotá-lo, caso da Alemanha (Baviera, Prússia e demais províncias, em 1700; e Reino Unido em 1751, quando o parlamento britânico eliminou: 3 a 13 de setembro de 1752. A adoção deste calendário pela Suécia foi tão problemática que gerou até o dia 30 de fevereiro. A China aprova-o em 1912, a Bulgária em 1917, a Rússia em 1918, a Romênia em 1919, a Grécia em 1923 e a Turquia em 1927.

Este assunto vem a baila aqui e agora, pois em decorrência da palestra As observações astronômicas de Galileu em 1609 e A Mensagem das Estrelas (1610), feita pelo Prof. Dr. Fernando Lang da Silveira, que assisti na sexta-feira no Grupo Interdisciplinar de História e Filosofia da Ciência, por três dias se estabeleceu uma frutuosa troca de mensagens catalisadas pelas excelentes colocações do Prof. Silveira.

Um recorte trazido foi acerca da mais momentosa reforma de calendários havida no mundo cristão. Veja-se que o papa então não arbitrava apenas posse de terras a serem descobertas (por exemplo, o Tratado de Tordesilhas) como definia calendário (civil, é claro).

Algo polêmico, em consequência da adoção do calendário gregoriano, em tempos diferentes, é a data do nascimento de Isaac Newton.

Na sua pátria natal se diz que ele nasceu no dia de Natal de 1642 pelo calendário juliano, ainda em vigor na anglicana Inglaterra.

Em selo da antiga República Federal da Alemanha, o ano do nascimento está como

1643 (e não como o usual 1642, ano sempre lembrado como o da morte de Galileu). Como se omitiram dez dias (de 5 a 14 de outubro de 1582) na passagem do calendário juliano para gregoriano, a data na Inglaterra na época do nascimento era 25/12/1642. Entretanto há uma controvérsia se a esta data efetivamente

corresponderia 4 ou 5 de janeiro de 1643 no novo calendário gregoriano. De qualquer forma seria janeiro de 1643, como está no selo. O Prof. Silveira alertou que no livro "Uma história da Astronomia" do Jean-Pierre Verdet (Editora Zahar -1991), ele tem uma seção intitulada "A data de nascimento de Newton".

Já que se trouxe comentários acerca da data do nascimento genial cientista vale aditar algo de seu epitáfio. Quando de sua morte em 1727 foi lançado um concurso para escolha do seria colocado em sua lápide. Eis os versos do poeta inglês Alexander Pope (1688-1744), selecionados e gravados no túmulo de Isaac Newton, na Abadia de Westminster, em Londres, Inglaterra:

Nature and Nature's law lay hid in night.
God sad “Let Newton be“ and all was light.

A natureza e suas leis jaziam dentro da noite.
Disse Deus “Que seja Newton” e a luz se fez.

Em “A Ciência através dos tempos” além do que está acima, ainda conto na p. 156 trago o comentário de Ilya Prigogine (1917-2003), Prêmio Nobel de Química em 1977, acerca desse epitáfio: "O tom enfático de Pope não nos deve admirar. Aos olhos da Inglaterra do século XVIII, Newton é o novo Moisés a quem as 'tábuas da lei' foram reveladas. Poetas, arquitetos, escultores e outros artistas concorrem a projetos de monumentos. Toda a nação se congrega para comemorar o acontecimento de um homem que descobriu a linguagem que a natureza fala – e à qual ela obedece"

Tive o privilégio, uma vez estando na Abadia de Westminster, de visitar o túmulo de Newton. Estão próximas a este as sepulturas de Charles Darwin e de Ernst Rutherford.

A essa pitada de História adito meus votos de uma quinta-feira. Anuncio que a dica de leitura terá como mote o período de 5 a 14 de outubro de 1582. Aguardem. Espero que possamos nos encontrar aqui a amanhã.

Um comentário:

  1. Fiquei intrigado com esses dias que não existiram. interessante. Professor, me dá aulas de química?

    wybrendon@gmail.com

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