ANO
8 |
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EDIÇÃO
2732
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Morreu, nesta terça-feira, dia 1º de abril, Jacques
Le Goff. Uma das maiores autoridades mundiais em Idade Média, o historiador
francês morreu em Paris, sua cidade natal, aos 90 anos.
Ele
revolucionou a historiografia moderna e reabilitou a imagem da Idade Média
europeia, mostrando-a como um período bastante mais dinâmico do que o humanismo
renascentista quis fazer crer. Quando em 1994, escrevi A ciência através dos tempos (que neste
2014 teve a sua 28ª reimpressão), abria assim o capítulo 6, ensinado por Le
Goff: “Idade
Média: noite dos mil anos ou...? Talvez, não haja período na história da
humanidade envolvido em mais fantasias, como milênio que medeia os séculos 4º e
15, até porque sobre ele talvez, saibamos menos que sobre a Antiguidade que o antecedeu.
Mas, muito provavelmente, a Idade Média não foi ‘a Noite dos mil anos’ descrita
por alguns. A Europa, então já ensaiava tecnologias e a Alquimia envolve
estudiosos. Surge a Universidade imbricada na Igreja”.
Le Goff autor de mais de 40 livros, entre os
quais Uma Longa Idade Média (2004),
foi escolhido 11 vezes doutor honoris causa na Europa e no Oriente Médio por
ter se tornado uma referência em seu domínio de estudos.
Caçando lendas, Le Goff fundamentou sua grande
linha de pensamento: a de que a Idade Média não fora uma era de obscurantismo,
como se imagina. Essa revolução quebrou a lógica moderna, que ao longo dos
séculos transformara o termo “medieval” em um adjetivo pejorativo. Le Goff viu
na Idade Média muito mais do que doenças, miséria, ódio, guerras e opressão.
Para ele, o período também foi sinônimo de alegria, de idealismo, de arte e de
amor.
Essa visão da história foi deixada pelo francês
em livros como A Civilização do Ocidente
Medieval (1964), O Nascimento do Purgatório (1981) e O Imaginário Medieval (1985). Nestes e em outros livros, sua mais
importante contribuição foi a consistência e a profundidade transdisciplinar com
que desmistificou a Idade Média, desenvolvendo uma análise sobre o período, que
incluiu revoluções sociais e intelectuais pouco conhecidas ou menosprezadas nos
nossos dias.
O historiador francês pertencia à terceira
geração de historiadores da escola dita dos Annales. A sua concepção de
antropologia histórica e o seu interesse pela história da cultura e das mentalidades,
de O Nascimento do Purgatório à
monumental biografia do rei São Luís, distinguem-no dos modelos de
interpretação social e econômica de Fernand Braudel, representando um modo
criativo de retomar o legado da revista fundada em 1929 por Marc Bloch e Lucien
Febvre. Le Goff, ao lado de outro francês, Pierre Nora, foi responsável pela
terceira onda dessa escola, lançando nos anos de 1970 a chamada Nova História. A partir de então, ele renovou
seu papel, buscando inspiração na antropologia para fundamentar interpretações
e análises mais vastas, o que lhe permitiu romper clichês.
Daqui para a frente, ele próprio fará parte da
História. Nos últimos anos de vida, embora sua saúde se degenerasse, continuava
ativo e lúcido, trabalhando em seu escritório, sempre cercado de milhares de
livros.
(Apoiado em notícias de Zero
Hora de Porto Alegre e O Público
de Lisboa)
A Idade Média guarda um "que" de poesia mágica que conquista a todos. O ser humano ainda não estava contaminado pelo consumismo e as relações humanas eram mais autênticas. Não se produzia em série, as coisas eram feitas com carinho.Dá para entender a paixão de Le Goff pela era.
ResponderExcluirSalve, Antônio Jorge!
ResponderExcluirparece muito adequada e provida de consistência histórica a tua conjectura para explicar como o Le Goff deu outra leitura ao adjetivo medievo.
Talvez, devamos pensar em nos refontizar e sermos mais medievos.
A admiração do