ANO
8 |
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EDIÇÃO
2729
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Nesta data tão significativa da história
brasileira — os 50 anos do golpe militar que
determinou uma ditadura que se estendeu de 1964 a 1987 — não sobra espaço
para trazida das muitas vivências recentes que envolveram desde dois sentidos
velórios em 48 horas até as saborosas emoções assistirmos, Gelsa e eu, com
quatro dos dez netos a ‘Corteo’ no Circle de Soleil.
Pensara em reproduzir aqui um dos muitos
textos acerca do cinquentenário hoje evocado. Seria fácil, pois as análises em
sua maioria destoam de posturas como aquela do deputado Jair Bolsonaro que
ousou pedir uma sessão da Câmara para celebrar o golpe. Resolvo, mesmo acossado
por outros fazeres, trazer comentários pessoais. Sei que isso é pretensioso,
pois não tenho estofo de historiador ou de sociólogo. Amealho algumas evocações
de então.
Vestibularmente, vale registrar que
diferente de hoje, as análises de então eram, em sua maioria, de apoio ao golpe.
A grande imprensa e a Igreja (por exemplo, a CNBB nos primeiros meses) eram a
favor do golpe. Talvez, se possa dizer que os militares golpistas tiveram, de
imediato, apoio da sociedade civil. Talvez uma das ações mais concretas disso é
a muito bem sucedida campanha: “Doe ouro para o Brasil’ onde as pessoas se
despojavam de suas joias pessoais e doavam para que ‘a revolução’ pudesse
salvar o Brasil. Nunca se soube o quanto e nem o destino do arrecadado.
Mesmo que não traga uma análise mais
densa, amealho algumas reminiscências. Remonto a 1961 quando iniciava o meu ser
professor. Nesse ano,
houve duas posses presidentes: Jânio Quadros e John Kennedy, cujos mandatos
terminaram colapsados de maneiras distintas, alterando.
A renúncia de Jânio Quadros, em 25 de agosto,
sete meses depois de assumir, desencadeou uma crise institucional sem
precedentes na história republicana do país, porque a posse do vice-presidente
João Goulart, que estava na China quando da renúncia de Jânio, não foi aceita
pelos ministros militares e pelas classes dominantes. O Movimento da
Legalidade iniciado por Brizola na Rio Grande do Sul se traduz como resistência
ao golpismo. A posse de Jango se pode acontecer com a aceitação da adoção do
regime parlamentarista, revogado depois por plebiscito.
Esta tentativa golpista contra a pose não
foi novidade. No inicio do mandato presidencial anterior (1956-1961) de Juscelino Kubitschek de Oliveira
(1902-1976) — que empolgou o país com seu slogan "Cinquenta anos em
cinco" e conseguiu encetar um processo de rápida industrialização, tendo
como carro-chefe a indústria automobilística — ocorreram as revoltas de Jacareacanga
e Aragarças que não prosperaram.
Jango empossado parecia que o país deslancharia:
propostas de um Movimento de Reforma de Base (reforma agrária, urbana,
bancária, universitária) empolgam e trazem esperanças a muitos (mas desagradam
as oligarquias dominantes). O Brasil ganha projeção internacional com eventos
singulares: bicampeonato de futebol no Chile em 1962, vitórias no basquete,
Eder Jofre no judô, Maria Ester Bueno no tênis, o sucesso da bossa nova, O pagador de Promessa leva a palma de
ouro em Cannes, o Centro Popular de Cultura leva teatro e cinema parara o povo.
Era um novo Brasil. Parecia que vivíamos um iluminismo tardio. Só que...
... as classes conservadores faziam um
alerta: o comunismo (vivia-se o auge da guerra fria) era uma ameaça em área
tutelada pelos Estados Unidos.
A CIA patrocina a vinda ao Brasil do padre
católico irlandês Patrick Peyton (1909 — 1992) pároco de Hollywood e fundador
da Cruzada do Rosário em Família - movimento autorizado pela Igreja que visava
unir as famílias em torno da oração. A visita do Padre Peyton, em 1963, reuniu
as maiores massas humanas de toda a história no Brasil e teve também um sentido
de pregação anticomunista, contribuindo para a preparação do golpe militar de
1964.
As inquietações com as reformas de base
do presidente e o perigo vermelho que assustava um catolicismo hegemônico e conservador
foram ingredientes para catalisar e acolher o golpe.
Na manhã do dia 31 de março de 1964, o
General Mourão disparou telefonemas para todo o Brasil, dizendo: "Minhas
tropas estão na rua!". Na noite do mesmo dia ordenou que as tropas da IV
Divisão de Infantaria que comandava em Juiz de Fora seguissem para ocupar o
estado da Guanabara, atual cidade do Rio de Janeiro. Seguiram sem resistência e
terminaram por se confraternizar no meio do caminho com as guarnições do I
Exército que haviam partido da do Rio de Janeiro com a missão de confrontá-las.
O Presidente vai ao Rio Grande do Sul.
Brizola organiza resistência com a adesão do Exército. Jango desiste. Sabe que
uma frota naval estadunidense está na costa brasileira para garantir os
golpistas. Para evitar derramamento de sangue, renúncia. Há documentário
brasileiro — O dia que durou 21 anos —
que detalha intervenções estadunidense no Brasil desde a renúncia do Jânio.
Esta é uma leitura de como começou a
ditadura, há exatos 50 anos. Há várias outras. Mas foi evocação de parte de uma
História que vi acontecer.