quarta-feira, 19 de setembro de 2012

19.- HIPÁTIA



Ano 7***          PORTO ALEGRE    ***Edição 2240
Uma quarta-feira para qual se prognostica ainda chuva. Esta, pela qual tanto se pediu, desde domingo, é desabrida. Já se fala de ‘enchentes de São Miguel’, cuja data está a dez dias. Ontem tanto nas aulas da manhã quanto da noite de Teoria do Desenvolvimento Humano a chuva justificou ausências.
Não entro no clima de vigília de feriado (amanhã é festa maior dos gaúchos), pois no começo desta tarde vou a Campinas, onde participo de mais uma edição (a sexta) da Semana da Educação - Unicamp. Hoje e amanhã, à noite, ministro um minicurso: PROPOSTAS PARA AÇÕES INDISCIPLINARES USANDO A HISTÓRIA E A FILOSOFIA DA CIÊNCIA e amanhã pela manhã tenho um segmento em uma mesa-redonda: “As Ciências Exatas nas Humanas”.
Ontem tive uma surpresa ao ler um texto acerca de Hipátia na Zero Hora. Ela é assunto recorrente aqui e está presente em dois de meus livros {A ciência através dos tempos e A Ciência é masculina? É, sim senhora!} e também quando falo de ‘mulheres na Ciência. Já fiz aqui também comentários do filme que foi lançado como “Ágora” e depois passou a chamar-se “Alexandria”.

Por tudo isso me encantou quando Cláudio Moreno — articulista de Zero Hora e meu colega como professor de Cursinho nos anos 60 — traz algo daquela que,  com Giordano Bruno, faz parte de vitrais que tenho no meu Scriptorium e por isso comparto com meus leitores.
Homens e mulheres (18) Pouco se fala em Hipátia, a jovem e trágica filósofa de Alexandria, fascinante personagem que a História praticamente escondeu. O que a perdeu foram suas virtudes: além de jovem e bonita, era extremamente brilhante, uma qualidade intolerável para uma mulher que, como ela, viveu no séc. 4 depois de Cristo. Educada pelo pai, Téon, também cientista famoso, ela o suplantou em tudo, sendo considerada por muitos autores contemporâneos – todos homens, é bom que se diga – como a mais brilhante matemática e astrônoma de seu tempo. Além disso, foi estudar filosofia em Atenas, onde conquistou o respeito unânime de seus mestres e colegas.
De volta a Alexandria, sua inteligência e sua erudição fora do comum atraíram discípulos e admiradores incontáveis – alguns, inclusive, dela se enamoraram, fascinados por aquela mistura preciosa de beleza e sabedoria; ela, no entanto, nunca teve homem, dedicando a castidade e a juventude ao estudo e à ciência. Vestida com o manto dos filósofos, andava pelas ruas centrais da cidade, explicando, a quem pedisse, os escritos de Platão e de Aristóteles. O próprio prefeito da cidade era seu discípulo e frequentemente vinha consultá-la, acompanhado de seus magistrados. Ironicamente, a seriedade de sua carreira e o imenso prestígio de que desfrutava atraíram a inveja de inimigos poderosos, que decidiram que ela tinha de morrer.
O cristianismo ainda estava se consolidando em Alexandria, e seus adeptos viam em Hipátia uma perigosa representante do paganismo, pois ela, com todo seu brilho, mantinha viva a cultura clássica dos gregos. Dizem que seu destino foi selado quando um dos bispos passou em frente à casa dela e se espantou com a pequena multidão ali reunida; ao saber que toda aquela gente estava ali para ouvi-la falar, incitou seus seguidores para que calassem para sempre a voz da jovem filósofa: quando ela saiu para sua caminhada costumeira, uma turba feroz de fanáticos a atacou, despindo-a e arrastando-a pelas ruas até o pátio de uma igreja. Ali, numa cena de incrível selvageria, retalharam seu corpo, arrancaram seus olhos, separaram-lhe a carne dos ossos e queimaram depois os despojos sanguinolentos; para justificar este crime hediondo, acusaram-na de feitiçaria e magia negra e esconderam o nome de seus assassinos debaixo de uma rede de versões contraditórias. A corajosa Hipátia pagou pelo pecado imperdoável de ser uma mulher culta num mundo exclusivamente masculino; seus matadores, agindo como se ela fosse uma aberração que precisava ser extinta, queimaram também suas obras e sepultaram seu nome no silêncio inexplicável dos livros de História. Hoje, mais do que nunca, ela volta para lembrar o quanto, apesar de tudo, nosso mundo melhorou – e muito.

3 comentários:

  1. Interessante observar as diferentes manifestações culturais em torno da chuva. Aqui no Rio de Janeiro culpa-se São Sebastião pelas enchentes de janeiro que devastaram a cidade na década de sessenta.
    Mas relendo sobre Hipátia, pois ja havia lido no "A Ciência é masculina? É sim senhora!", em sua forma de ser executada meu pensamento arremeteu-me à uma similar, a de Damien, parricida que tem sua morte relatada no prefácio de "Vigiar e Punir" de Foucault. Independente de uma ser inocente e do outro ser culpado, o que me chama atenção é a barbarie da época.

    abraços

    Antonio Jorge

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  2. Limerique

    Ciência, mediocridade e machismo
    Entre elas e eles criaram abismo
    Hipátia imolada
    Em nome do nada
    Subsistiu apenas obscurantismo.

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  3. Aqui em Bagé não podemos reclamar da chuva professor, nosso município vivia em situação de emergência devido á estiagem, portanto é quase um benção.
    Não tive acesso ao artigo da Zero Hora ainda, mas estou com o filme locada e faremos um seção de cinema durante o feriado.

    Abraço.

    Antonio Luiz Ortigara Filho

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