sexta-feira, 6 de abril de 2012

06.- ACERCA DE UM PLENILÚNIO



Ano 6***  SEXTA-FEIRA SANTA  ***Edição 2074
Vivemos, uma vez mais, uma Sexta-feira Santa, que envolve crentes e não crentes. É talvez o dia de maior religiosidade do calendário cristão. Não sem razão que a Elzira, uma muito assídua leitora deste blogue, já há quatro anos, falava aqui dos ‘cristãos de Sexta-feira Santa’. A imagem do crucificado, quanto mais parecer dolorosa, mais impregna ‘devoção’. Há também aqueles que durante o ano não são frequentadores de igreja, mas hoje se transvestem de penitentes.
A Sexta-feira Santa talvez seja a data da cristandade de mais densa em tradições. Recordo, em minha infância que nesse dia não ligávamos rádio (as emissoras de rádio, nesse dia só apresentavam música clássica, sem qualquer comercial ou noticioso – talvez por isso que no meu imaginário a música clássica foi por um tempo associada à música fúnebre), não se varria a casa, não se ordenhava as vacas, falava-se baixo e cantar ou assoviar jamais; o risco de pecar por assoviar nunca corri, pois até hoje não sei fazê-lo. A infração mais grave era pregar algo, pois então estaríamos repregando Jesus na cruz. Como filho de marceneiro pode-se imaginar quanto isto era cuidado.
Era o dia de colher marcela, antes que o sol secasse o sereno que ela recebera na noite da prisão de Jesus. A propósito desta tradição popular — ainda muito presente nos dias de hoje — escrevi um “Uma sexta-feira (ainda) santa”, conto que foi premiado no ‘Concurso os botos do rio Tramandaí’, nos anos 90, promovido pela Prefeitura de Tramandaí e pela UFRGS.
Em 2002, quando vivi na Espanha durante o pós-doutorado, tive o privilégio de passar a Semana Santa na Andaluzia. Acompanhar as procissões — que podem ser lidas como verdadeiros desfiles de arte, organizadas pelas confrarias que as preparam o ano inteiro — é algo quase inenarrável. Fiz isto em Córdoba, Granada, Cádiz e Sevilha. Tenho um livro ‘Memórias de Viagens’ pré-pronto, no qual a Semana Santa andaluz de 2002 é um dos capítulos mais prenhe de emoções. Talvez, se pudesse bisar apenas uma de minhas dezenas de viagens, esta seria a preferida.
Nesta semana, nas três turmas de graduação que dei aulas, perguntei como era determinada a data da Páscoa e o espaço temporal de sua variação. Ofereci pistas: plenilúnio / equinócio. Mostrei a importância da definição anual da data da Páscoa, pois esta determina a data do Carnaval, Quarta-feira de cinzas, da Ascensão, de Pentecostes, e Corpus Christi etc. Não houve entre os meus alunos a associação de sempre a noite de Sexta-feira Santa é de plenilúnio, ou seja, a lua é contemplada em sua intensidade máxima (= lua cheia).
A Páscoa ocorre sempre na primeira lua cheia do equinócio de primavera no Hemisfério Norte (ou de outono no Hemisfério Sul). Como o calendário lunar é independente do calendário solar vemos que essa variação é de trinta e quatro dias, ou seja, cinco semanas menos um dia. Como o equinócio (quando temos o dia com 12 horas de sol e 12 horas de noite) de outono (no Hemisfério Sul) é em 22 de março, há a possibilidade de variação entre 22 de março e 25 de abril.
Esta maneira de se definir a data da Páscoa aconteceu em 325, quando ocorreu Concílio de Niceia, tido na história como primeiro Concílio ecumênico. Até então o Cristianismo permanecia tão somente como uma seita do judaísmo tal como os Fariseus, os Saduceus ou os Essênios - os cristãos eram inicialmente conhecidos como Nazarenos -. É a partir deste Concílio que se pode falar em uma Igreja cristã.
Há denominações cristãs que tem fixada a Sexta-feira Santa em 12 de abril, definida a partir de leituras dos Atos dos Apóstolos relacionadas com a data da morte de Jesus no suposto ano 33 da era cristã.
Um jornal de Porto Alegre, na véspera da Páscoa de 2006, em um material de curiosidades acerca da festa, explicou que para calcular a data da Páscoa bastava adicionar 46 dias a data do Carnaval. Certamente, ao fazer matéria sobre o Carnaval poderia explicar que para calcular a sua data basta subtrair 46 dias da data da Páscoa.
Neste dia desejo aqueles e aquelas que cultuam a data um dia de frutuosas meditações. A todos um muito curtido plenilúnio na noite de hoje. Adito um convite para uma dica de leitura dentro do tema que foi assunto aqui nesta semana

6 comentários:

  1. Caro Attico,

    Eu fiz a mesma pergunta a meus estudantes acerca da Quarta Feira de Cinzas e Carnaval, em fevereiro.

    É interessante notar inserções de um calendário lunar dentro de um calendário solar.

    Ainda sobre calendários, seria interessante explicar porque um dia tem a duração de vinte e quatro horas (ou dois ciclos de doze horas).

    Abraços,

    PAULO MARCELO

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  2. Meu caro Paulo Marcelo,
    o sistema sexagesimal é uma das grandes evidência da construção humana do conhecimento. Surpreende-me que estamos criando uma geração que não sabe ‘ler as horas’ em um relógio analógico. Pergunte a um adolescente: ¿Por que quando o ponteiro grande está no 4 lemos 20, ele terá dificuldade de entender?
    Um curtido plenilúnio esta noite na linda Olinda,
    attico chassot

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  3. Caro Chassot,
    Parabéns pela postagem da Paixão. Abraços, JAIR.

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  4. Grande Chassot, não podemos nos furtar de levar estes conhecimentos as novas gerações. E, não por "coincidência" a lua estava maravilhosa em Porto Alegre. Grande abraço. Jaime Gross Garcia

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  5. Amigo Chassot,
    faço um comentário atrasado; envolvi-me numa visita a familiares no interior e passei batido, mas retomo agora. As lembranças sobre as sextas-feiras santas são prenhes de significados. Por cerca de 36 anos estive a frente de paróquias nas quais deveria presidir os atos litúrgicos, mas sempre foi uma data na qual percebia a diminuição dos crentes em virtude do aproveitamento do feriado para viagens diversas. Muitas vezes busquei inspiração na narrativa de João que enxerga no sacrifício e morte de Jesus o ponto de maior glória.
    Um abraço,

    Garin

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