domingo, 17 de julho de 2011

17.- E... de novo: British Museum

Ano 5

Londres

Edição 1809

05/23 DIARIO DE UM VIAJOR EUROPA 2011 Um domingo londrino agélsico. Gelsa e eu nos despedimos às 09:30 a.m. de ontem na estação Oxford Circus; ela partindo para Manchester, onde desde ontem e até terça-feira participa de evento.

Nesta blogada dominical, vejo-me conservador. Nas três vezes anteriores que estive em Londres: em 1991, 1996 e 2008, dei destaque a visitações ao British Museum. Pois ontem, às 10h, quando abriram os seus portões eu estava lá. Fiquei até um pouco depois das 4h da tarde. Claro que nestas mais de 6h não tive a pretensão de ver um décimo do Museu. Assim, nesta Londres 2011 não estou sendo original.

Justifico a minha fidelidade ao BM, porque ele sempre surpreende: Em 2008 tive uma grande novidade: a grande cúpula – a Great Court – que o converteu – segundo se informa – no maior espaço público fechado da Europa. Esse espaço criou um magnífico local para as exposições temporárias e também para lojas de souvenires. Essas, a meu gosto, superabundam no BM.

Há também dezenas de urnas pedindo donativos. Como o ingresso ao acervo permanente é gratuito (só são pagas algumas exposições temporárias) em cada sala há sugestões de valores para doações. À primeira vista parece que se pode dizer que os pedidos são generosamente correspondidos. Algo que me surpreendeu ontem foi o número de visitantes. Não consigo estimar, nas seis horas que durou a minha visita quantas mil pessoas estiveram ali. Talvez umas 20 mil.

Cada vez que visitamos museus nacionais de potências (que foram) colonizadoras nos assaltam sentimentos complexos e dúbios. Assim, não me parece tão natural estar aqui no BM, marcada como um dos tesouros principais do museu, a Pedra Roseta. Vi, em 2002, na Biblioteca de Alexandria uma reprodução (claro que não tão pequena quanto a que tenho nos jardins da Morada dos Afagos). Países que foram grandes ‘colonizadores’ têm seus ricos museus formados em grande parte por materiais ‘trazidos’ de antigas colônias. O BM, pelo fato do Reino Unido ter sido dos mais países mais expansionistas (vale recordar a citação da Rainha Vitória que fiz ontem), é um bom exemplo desse enriquecimento.

Há um tempo, vários países estão pedindo, (e alguns já conseguiram), a repatriação desses tesouros. Já vi à disposição do público materiais acerca desta polêmica, mais especificamente da situação do pedido de devolução feito pela Grécia de esculturas do Parthenon. Inclusive grande parte deste edifício, está no BM e também e uma das atrações do Pérgamon de Berlin. Primeiro tentam convencer que foram eles (os ingleses) que salvaram essas peças da destruição completa, pois as arrecadaram entre ruínas. O que não deixa de ser verdadeiro. Basta recordarmos que, por exemplo, o Parthenon, que foi erigido aos deuses gregos há 2.500 anos, depois foi uma igreja cristã, uma mesquita islâmica e era ruína quando os venezianos tinham o poder sobre a região e fizeram do Parthenon um depósito de pólvora. Alega-se, então, que em tempos mais próximos, arqueólogos de vários países se puseram a restaurar as obras, que foram adquiridas pelo BM, que generosamente não cobra taxa para exibi-las. Cita-se mais sete museus que também têm esculturas do Parthenon (como, Louvre, Vaticano...).

Mas vejo que estou voltando a tema já repisado. Permito-me restringir-me a visita de ontem. Iniciei assistindo a exposição “Treasures of Heaven saints, relics and devotion in medieval Europe.” [Tesouros do Paraiso: santos, relíquias e devoção na Europa medieval] cuja taxa de admissão é 12 Libras (aproximadamente 30 reais) e valeu muito a pena. Por mais de duas horas encantei-me nesta grande exposição que reúne pela primeira vez alguns dos melhores tesouros sagrados da época medieval. Possui mais de 150 objetos oriundos de mais de 40 instituições, incluindo o Vaticano, tesouros de igrejas europeias, de museus dos Estados Unidos e Europa incluindo acervos da coleção própria do Museu Britânico. A exposição está no espaço principal, em uma abóboda que imita uma catedral envolta em música sacra emocionante.

A ilustração Relicário busto de um santo desconhecido do sexo feminino, provavelmente um companheiro de Santa Úrsula. Sul dos Países Baixos, c. 1520-1530 é do cartaz e da capa do lindo livro da exposição e pertence ao BM.

A exposição que em alguns momentos me pareceu pouco crítica no que se refere a ‘mistificações’: há relicários que dizem conter pedaços da cruz verdadeira, encontrada cerca de 4 séculos depois, espinhos da coroa, pregos sangue da crucificação, leite do peito de Maria ou até gotas de suor de Maria, quando do parto de Jesus ou restos de seu cordão umbilical. Pode-se imaginar as belezas dos relicários nos quais estas ‘preciosidades’ estão guardadas.

Trago um exemplo das muitas peças que vi neste sábado: O Relicário para os espinhos da

coroa de Jesus, provavelmente, criado no 1390. O relicário foi legado ao Museu Britânico em 1898 por Ferdinand de Rothschild. É feito de ouro, ricamente decorado com joias e pérolas, e utiliza a técnica de esmaltagem para criar um total de 28 figuras tridimensionais, principalmente em esmalte branco, que tinha sido recentemente desenvolvido quando o relicário foi feito.

Ao final, na última das 9 salas, há a trazida das vozes críticas de Lutero, quando em 31 de outubro de 1517 afixas suas 95 teses discordando da Igreja romana ou a interrogação inflamada de Calvino: "Como sabemos que estamos venerando o anel e ou pente da Virgem Maria e não de bugigangas de uma prostituta?" Mesmo com todas as mistificações é uma exposição preciosa.

Ainda assisti uma exposição temporária: Adornment and identity: jewellery and costume from Oman [Adornos e identidade: joias e costumes de Oman]. A exibição apresenta uma seleção do século 20 de joias de prata, armamento e vestuário masculino e feminino a partir de Omã.

A amostra inclui pulseiras, tornozeleiras, colares, brincos, enfeites de cabelo, potes de cerâmica. Pode-se ver coloridos figurinos bordados, incluindo roupas infantis, de diferentes regiões de Omã. Há muitas peças amuleto e edições muito elaboradas do Alcorão elaborado.

O Sultanato de Oman é um país com uma história que remonta ao terceiro milênio a.C. do qual eu conhecia muito pouco. Também essa exposição foi muito valiosa.

Ainda visitei a Biblioteca Paul Hamlyn, que fica no BM e foi frequentada para estudos por Charles Darwin e Karl Marx entre outros. Isto é algo que me emociona

Fiz ainda uma recorrida geral. Estive na sala mais visitada: a das múmias. Todavia, vale registrar Museu Britânico abriga mais de sete milhões de objetos de todos os continentes, ilustrando e documentando a história da cultura humana de seus primórdios até o presente. Muitos dos artefatos da sua coleção estão armazenados nos depósitos situados nos porões do museu, por conta da falta de espaço para mostrá-los. Com disse, não dá para ver tudo. Há que voltar ainda antes de quarta-feira.

Encerro com um comentário de quem passou mais se seis horas vendo além de obras de museu milhares de humanos. Há pessoas que entram em uma sala, se fazem fotografar junto de uma obra famosa e saem da sala sem sequer olhar para a peça ou algo mais da sala. Todavia, estão certificadas que ‘viram’ a obra. Há outros que percorrem a sala inteira filmando, sem olhar ‘ao vivo’. Certamente verão o filme em casa.

Um bom domingo a cada uma e cada um. Eu tenho já uma agenda dominical preciosa. Conto amanhã, queiram as muitas relíquias que devem ter me abençoado.

4 comentários:

  1. Caro Chassot,

    fico imaginando a grandiosidade cultura que há no BM, de diversos recantos do planeta. É verdade que muita coisa não existiria mais se não estivesse aí, mas é possível que outras tantas tenham sido arrancadas violentamente de culturas bem construídas, agora já derrotadas pelos invasores.
    Interessante a tua observação sobre os visitantes 'virtuais', que passam fotografando e filmando - a quem estão enganando?

    Um forte abraço e bom resto de domingo!1

    Garin

    http://norberto-garin.blogspot.com

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  2. Caro Chassot,
    Mais uma vez visitamos um sitio cultural da maior importância através do teu olhar, da tua crítica e do teu cérebro. Tu consegues muito mais do que olhar, consegue VER, e isso nos informa conteúdos e histórias ocultas que só tua erudição e verve podem passar. Adoro museus, certa ocasião passei um dia inteiro no Louvre, só saí quando as portas estavam para ser fechadas e gentilmente expulsaram os últimos visitantes. Quanto ao acervo dos museus de ex colonizadores, há que se colocar numa posição menos crítica, por exemplo, o museu histórico de Bagdá foi destruído e suas peças valiosíssimas foram roubadas por ocasião da invasão que os soldados do Bush empreenderam àquela cidade. Podemos afirmar que, embora o acervo do BM seja, em sua grande parte, produto de espólio, não corre o risco de perder-se numa dessas instabilidades sociais que ocorrem no oriente próximo. Abraços e profícuas andanças pelas "Oropas", JAIR.

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  3. Meu Caro Garin,
    as críticas feitas aos ‘saques’ não invalida a defesa dos museus com conservadores do acervo cultural da humanidade.
    Realmente há turistas físicos virtuais.
    Sei que já é noite de domingo aí e aqui, mas ainda vale agradecer e retribuir teus votos.

    attico chassot

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  4. Meu caro Jair,
    obrigado pela valorização que dás aos meus narrares. Há pouco pre-postei a blogada de amanhã e lembrei de teus estímulos.
    Os ‘Colonizadores’ também foram ‘preservadores’ de acervos culturais, mesmo que tenham exterminado culturas.
    ¿O que sabemos do Brasil antes de 1500?
    Uma boa semana

    attico chassot

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