sábado, 9 de abril de 2011

09.- O Sorriso Etrusco’

Porto Alegre * Ano 5 # 1710

Já vivemos o segundo sábado abrilino. Hoje inauguramos o ciclo dos aniversários do mês. Contei na inauguração do mês que três de meus seis netos são abrilinos; a Clarissa, uma de minhas filhas, faz aniversário em abril.

A nominação deste mês tem explicações distintas: seu nome deriva do latim Aprilis, que significa abrir, numa referência à germinação das culturas. Outra hipótese sugere que Abril seja derivado de Aprus, o nome etrusco de Vênus, deusa do amor e da paixão. É por esta razão que surgiu a crença de que os amores nascidos em Abril são para sempre. Outra versão é que se relaciona com Afrodite, nome grego da deusa Vênus, que teria nascido de uma espuma do mar que, em grego antigo, se dizia "abril".

Vamos hoje à Estrela para celebrar os seis anos do Guilherme, completados ontem. Ele, filho da Ana Lúcia e do Eduardo terá pela primeira vez a presença de seu irmão Felipe, nascido em 8 de setembro. O gostoso destes aniversários são os reencontros familiares. E Isso já deve começar na viagem, pois vão conosco a Laura o Antônio e Maria Antônia.

Hoje a dica de leitura é de um dos livros mais sumarentos que já li. Já em 01 de março de 2008 ele foi dica de leitura – quando ainda não havia a formalização destas edições sabáticas. Como acredito na variação do público leitores permito-me, sem pejo, recorrência.

A dica de hoje é uma das mais lindas histórias de amor e um verdadeiro hino ao avonado, palavra que me é outorgada a criação e aqui neste blogue já muito referida. Dedico particularmente esta blogada a cada uma e cada um de meus leitores que vivem e curtem o privilégio de serem avós e também àqueles que um dia viverão tais dulçores. Para não deixar ninguém de fora: também aos netos que ensejam o avonar.

Faz diferença ler um livro quando se sabe que seu autor é por sua destacada trajetória literária e por seu pensamento comprometido com os problemas de seu tempo, uma referência intelectual e moral de primeira ordem na Espanha na segunda metade do século 20. Adite-se a isso, então, algo mais na dica de hoje.

SAMPEDRO. José Luis. O Sorriso Etrusco. São Paulo: Martins Fonte, 1996, 363p. ISBN 85-336-523-4

José Luis Sampedro Sáez nascido em Barcelona em 01 de fevereiro de 1917, como economista foi catedrático de Estrutura Econômica na Universidade Complutense de Madrid. Foi também professor de Economia na Universidade de Liverpool. Na área econômica tem uma extensa produção de livros e artigos. Hoje mora em Madrid onde continua escrevendo sendo um lúcido crítico da decadência do Ocidente, especialmente marcada pelo capitalismo selvagem. No dia internacional do livro de 2007, já com 90 anos, participou de manifestações contra a possibilidade de se introduzir o pagamento pela retirada de livros nas bibliotecas. Reconhecido como um humanista e escritor que luta por uma “economia mais humana e mais solidária, capaz de contribuir para desenvolver a dignidade dos povos.”

É um novelista com extensa produção onde se destacam, além do livro de 1985, aqui recomendado: Congreso en Estocolmo (1951), El río que nos lleva (1961), El caballo desnudo (1970), Octubre, octubre (1981), La vieja sirena (1990), Real sitio (1993), El amante lesbiano (2000) y La senda del Drago (2006).

O Sorriso Etrusco conta com muita poesia a história de um campônio, transplantado de sua pequena comunidade rural da Calábria, no Sul da Itália para Milão. Vem morar na casa do filho para tratamento de grave doença. Então conhece o neto, que para sua surpresa não é um nenê como imaginava, pois já tem 13 meses e inicia a caminhar. O choque cultural com filho e com a nora é fantástico.

As dificuldades vão além: o convívio com a cidade grande. Os milaneses, segundo o velho, não sabem viver e falam um italiano de rádio que ninguém entende. Renato e Andréia não sabem educar o neto dentro da sabedoria calabresa. Além de fazerem Brunettino dormir sozinho no quarto, têm restrições aos mimos que lhe dá ao avô. Só fazem com o menino o que diz o livro ou as tábuas da lei pediátrica. Lá na Calábria mulheres não sabem ler, portanto não consultam livro criam melhor as crianças. “Maldito livro que diz quando as crianças devem acordar e quando devem ter fome!”. Maldito seja também esse pediatra marica de bigodinho que poderá até comprometer a masculinidade do neto. Mas de tudo isso o avô que com muita dificuldade aprendeu abotoar os botões de pressão da roupinha – procura proteger o neto, quando às escondidas, na madrugada, se esgueira para o quarto onde o menino dorme sozinho. Então ele desfia-lhe as melhores evocações de sua juventude, sonhando em transformá-lo em um autêntico calabrês, que há de suceder-lhe em bravura e também no amor às mulheres. E, então, vem as continuadas evocações das mulheres calabresas com quais ele fez amor

O neto, por coincidência leva nome de guerra do avô – Bruno – quando lutava com seus camaradas partigiani contra os invasores alemães. Só isso já é um presságio da bravura que terá o menino. O ‘nono’ tem muitas implicância com a nora. Mesmo que ela tenha dado-lhe Brunettino, ela não tem bunda e não tem peitos. Não sabe em que Renato se encantou nessa filha de um Senador aliado ao fascismo.

Entre as várias nem sempre bem sucedidas tentativas de contatos com a cidade grande, o velho termina por descobrir o amor de uma mulher. Isso o transforma. Claro que Hortência não é uma destas milanesas. Estas parecem que são todas de plástico ou retocada como as mulheres de capas de revistas que ele olha nos jornaleiros.

Outra novidade que embasbaca a nora, professora universitária iniciante, que julga o sogro um tosco. Ele está colaborando em seminários na Universidade com as maiores autoridades em etnologia, às quais ela não tem acesso, onde vai contar antigas lendas calabresas.

Este texto é talvez uma das mais lindas histórias de amor da literatura moderna, que oferece um profundo conhecimento da alma de um homem que fala com a cobra, figura do câncer que lhe devora interiormente. Mas antes do desfecho acontece o esperado. O neto diz ‘nono’ e com sotaque calabrês.

Não é sem razão que na Espanha esse livro já teve mais de 40 edições, desde a primeira em 1985. Com muita alegria desejo um merecido domingo a cada um e cada uma. Àqueles que não conhecem “O sorriso do etrusco” auguro possam um dia se deleitar com esta linda história de amor.

Com votos de que a fruição do sábado se espraie pelo fim de semana. Para amanhã um novo convite para um encontro aqui.

Esse blogue conclama a adesão à campanha: este ano 23 de abril – o Dia Internacional do Livro – ocorre no sábado de aleluia, por tal uma sugestão: que o coelho traga livros, ao invés de ovos.

4 comentários:

  1. Caro Chassot,

    permita-me comentar um trecho da parte inicial da tua "blogada" de hoje: "Outra hipótese sugere que Abril seja derivado de Aprus, o nome etrusco de Vênus, deusa do amor e da paixão. É por esta razão que surgiu a crença de que os amores nascidos em Abril são para sempre."

    Concordo com essa hipótese, também acho que os amores nascidos em abril são para sempre: comecei a namorar minha esposa em abril.

    Mas não é por essa última referência que ratifico a crença: é que todos os amores são para sempre. Mesmo que venhamos a nos tornar inimigos de alguém a quem um dia amamos, isso não apaga o amor com que os amamos um dia. Todos os amores são perfeitos, posto que encravamos em nossas histórias, não podem ser removidos (e não devem).

    Todos os amores são para sempre!

    Um abraço,

    Garin

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  2. Muito ilustrado colega Garin,
    permito discordar e acompanhar Vinicius de Morais, o etílico filosofo-poeta: o amor é eterno enquanto dura.
    Há amores que sonhamos esquecer num ritual sofrido de desamar.
    Com estima
    attico chassot

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  3. Um livro que sintetiza o entrechoque cultural mas não anula o amor de um avô pelo netinho-promessa do futuro melhor! Com meus pequenos netos - e dificuldaes inimagináveis no tocante á liberdade para amá-los - reverencio emocionadamnete o autor.
    Netos = sobremesa da vida!
    ljpiuntiescritor@uol.com.br
    Itu sp

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  4. Prezado amigo incógnito,
    que infiro seja escritor,
    tu és a segunda pessoa que, hoje, reforça a tese que blogue antigo, diferente de jornal velho, não serves apenas para enrolar peixe.
    Ressuscitaste uma blogada de quase quatro anos para render preito ao genial José Luis Sampedro, que faleceu a 8 de abril do ano passado, 96 anos.
    Ele nos ensinou curtir os dulçores do avonar, ou a sobremesa da vida como chamas.
    Obrigado pela parceria intelectual,
    attico chassot

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