sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

24.- Evocando outros 24 de dezembro


Porto Alegre Ano 5 # 1604

Não posso omitir um registro de ontem: a Clarinha, Bernardo, Gelsa e eu, no crematório de São Leopoldo, nos despedimos da Jane, que inerte parecia irradiar jovialidade nos seus 51 anos densamente vividos. Foi muito significativo estar com a Suzana, Carolina e Patricia, que choravam a perda da mãe, que por 14 anos também representou a figura do pai. Encantamo-nos com a July, despedia-se da avó que também era sua mãe. Ela, nos seus 10 anos, fez desfilar livros e autores que a encantam e com sabedoria disse: “Sei que ainda não caiu a minha ficha, quanto ao significado da morte de minha avó”. Foram momentos comoventes e nos prometemos não deixar estes reencontros para um próximo ato fúnebre.

Ao final da blogada de ontem havia anunciado para hoje o conto “Missa do Galo pós-moderna”. Este se fizera sugestão, pois uma das mais densas lembranças dos natais de minha infância é a missa do galo, que há mais de meio século não assisto e muito pouco ouço referências. Recordo a longa espera e até os cochilos durante o sermão que perecia interminável. Cheguei a pensar em trazer um conto clássico natalino ou o muito conhecido ‘A missa do galo’ de Machado de Assis. Devo dizer que até o reli alguns na busca de algo para esta blogada.

Ficara satisfeito um conto muito original que encontrara. Colhera-o numa destas tarrafadas que fazemos a esmo na rede. Estava em www.xxxxxxxxxxx.com.br, porém razões técnicas que advieram fraudo a expectativa de algum leitor que ficara atraído pelo reclame que fizera ontem. Desautorizei-me de publicar.

Assim, amealho aqui algumas lembranças que dizem de minhas emoções com as evocações desta dita noite santa de antanho. Já que falei em evocação: no texto há uma palavra que não é corrente no significado que usei: reclame. O muito consultado dicionário português Priberan apresenta reclame como ‘buraco, no alto dos mastros dos barcos rabelos, onde passa uma corda’, mas o Aulete consagra acepção que já foi corrente: Anúncio publicitário veiculado pelos meios de comunicação. [do francês reclame]. Porém o Priberan dicionariza reclamo: Publicidade, feita por qualquer forma, para tornar conhecida uma pessoa, uma obra, um produto. Traz como sinônimo chamariz.

Aqui, assiste ao leitor que reclame: onde estão as evocações natalinas nesta ‘aulinha’ de português? Brincar com palavras é algo que me encanta. Como natal também evoca brinquedos, concedo-me esta digressão. Volto à busca de substituições ao texto glosado (na acepção de cortado).

É provável que algum leitor mais jovem desconheça ‘a missa do galo’ pois salvo equívoco, ela ainda tem tradição no Vaticano, onde o papa chama a si sua celebração. Afora ali, parece que não faça mais parte dos rituais natalinos como em minha infância.

Missa do Galo é o nome dado à missa celebrada depois do jantar da Véspera de Natal que começa à meia noite de 24 para 25 de dezembro. Seu nome consagra a lenda segundo a qual à meia-noite do dia 24 de dezembro um galo teria cantado, anunciando a vinda do Messias. Outra origem da expressão é citada em o De onde vêm as palavras, de Deonísio da Silva (Editora A Girafa): dado ao fato de a Missa de Natal normalmente terminar muito tarde "quando as pessoas voltavam para casa, os galos já estavam cantando".

Outra lembrança que guardo era aquela do dia 24 quando eu tinha o privilégio – talvez por ser o mais velho – de ajudar minha mãe na montagem do presépio. Uma peça de casa era interditada aos demais. Ali se realizava, em espaço que cobria a metade da área, a montagem da vila de Belém, que recebia as mais fantásticas intervenções no seu cenário. Talvez nenhum belemita reconhecesse sua vila. Aliás, isso é traduzido pela miríade de representações de presépios que existem.

Recordo que em um ano havia um lago – a gamela que era usada durante o ano para a lavação dos pés quando vínhamos da rua – onde nadam patinhos de celuloide que evocavam pertencimento a gerações passadas; tinha uma queda d’água que girava uma roda que tracionava um moinho; havia uma fogueira (uma lâmpada revestida de celofane vermelho coberto por carvões) onde se aqueciam pastores; havia duas angolistas que moviam os pescoços, que se comparadas às ovelhas em suas dimensões deveriam ser maiores que dinossauros; duas formas destas para assar pão recebiam terra, onde arroz germinado já há duas semanas imitavam uma pastagem onde estava um pastor com um rebanho de ovelhas, que fora uma herança de alguém não se guardava o nome.

A gruta, feita de barba de pau – conseguida semanas antes em longas caminhadas até o Faxinal – tinha José e Maria com o berço vazio, este só receberia o menino, à noite, durante o canto de ‘Noite Feliz’ – que fora ensaiado a cada dia nas semanas que antecediam a grande noite. Só então ocorria a entrega dos presentes.

Lembro que um ano, montei atrás da gruta uma caixa de madeira, com sua boca coberta por um papel de seda azul, onde eu havia colado estrelas e uma lua de papel prateado, e dentro da caixa uma lâmpada acoplada a um pisca-pisca. Um sucesso tecnológico para os anos 1950s.

Como já quase cumpri a substituição do texto, trago apenas mais um lembrança. Minha primeira desconfiança acerca da veracidade do papai-noel. Primeiro devo dizer que este entrou tardiamente em minha infância. Minha avó materna – Bárbara Volkweiss – falava sempre em São Nicolau ou Heilige Nicklas ou ainda que quem dava os presentes era o Chriskinder ou Menino Jesus. Tínhamos que varrer o pátio, para o burrinho de são Nicolau encontrar o pasto que lhe cortávamos e que desaparecia durante a noite, se nos comportássemos com dignidade para receber presentes.

Mas meu primeiro descrédito a tudo isso surge muito cedo: a letra A do meu nome era exatamente como lindo e original A que só minha mãe fazia tão lindo. Quando via aquele A usado por outrem, considerava uma traição. Minha mãe acalmou minha desconfiança dizendo que ela ajudava o Papai Noel. E eu acreditei?

Missão cumprida e comprida. Não saiu o texto que sonhava. Serviu para mexer em lembranças. Desejo que cada uma e cada um nesta vigília natalina relembrem momentos de sua infância e com eles embalem gostosas recordações. Lemo-nos amanhã. Ah!... Um feliz Natal!...

6 comentários:

  1. Muy querido Profesor Chassot,
    Lindos recuerdos!!! Aquí le envío una tarjeta virtual:
    http://ak.imgag.com/imgag/product/preview/flash/bws8Shell_fps24.swf?ihost=http://ak.imgag.com/imgag&brandldrPath=/product/full/el/&cardNum=/product/full/ap/3166187/graphic1
    Que tenga una Feliz Navidad!
    Felicidades también para todos los lectores de su blog!! Con cariño,

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  2. estimado Chassot,venho lhe desejar um feliz natal e um excelente 2011!

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  3. Muy amable Matilde,
    gracias -- en mi nombre y de todos los lectores de este blogue -- por tus deseos.
    Que los lectores puedan usufruir de las bellezas de la tarjeta virtual que ofreciste.
    Deseo a ti y a todos los tuyos las mejores alegrías en la noche sancta de hoy.
    Con continuada admiración
    attico chassot

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  4. Muita estimada Elaine Sueli,
    é muito bom receber teus votos desde a querida Rondônia, local de uma de minhas significativas viagens neste 2010 que se esvai.
    Agradeço e retribuo para ti e para os teus
    attico chassot

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  5. Que coisa mais linda esse post!
    Nossa, uma delicadeza e simplicidade que encantam...
    Eu tb fazia o presépio com barba de pau... Na minha rua havia uma figueira centenária que fornecia farta matéria prima para o bercinho do menino jesus...
    bjus
    Eunice

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  6. Muito querida Eunice,
    alegro-me que esta blogada tenha te efeito evocar teus natais. Buscar barba de pau era algo memorável.
    Caminhávamos quilômetros.
    Obrigado por chegares aqui,
    attico chassot

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