segunda-feira, 13 de setembro de 2010

13- Inteligência e pobreza


Porto Alegre Ano 5 # 1502

Uma segunda-feira que abre a última semana de inverno. Aliás, o fim de semana por estas latitudes foi de tempo carrancudo. É verdade quês as plantas caducifólias se revestem de um verde viçoso. Quando se contempla, por exemplo, as videiras, parece visível a cada mirada o crescimento da brotação. Esta contemplação é algo encantador.

Mas a uma segunda-feira apetece um assunto mais denso. Brindo meus leitores com um texto de Drauzio Varela que foi publicada. Há evidências de que pobreza e Quociente de inteligência estão relacionados. Lembrando que Quociente de inteligência (abreviado para QI, de uso geral) é uma medida obtida por meio de testes desenvolvidos para avaliar as capacidades cognitivas (inteligência) de um sujeito, em comparação ao seu grupo etário. A medida do QI é normalizada para que o seu valor médio seja de 100 e que tenha um determinado desvio-padrão, como 15. Vale a pena conhecermos este texto.

Antes é conveniente recordar que Drauzio Varella (São Paulo, 1 de janeiro de 1943) é

um médico oncologista e escritor brasileiro, conhecido por popularizar a medicina em seu país, através de programas de rádio e TV. Foi também um dos fundadores da Universidade Paulista e da Rede Objetivo, onde lecionou física e química durante muitos anos.

Além das campanhas de prevenção, Drauzio Varella também é um premiado escritor, tanto de ficção para adultos quanto para crianças. Lançado em 1999, o livro Estação Carandiru, que conta sobre seu trabalho com os presidiários do Carandiru, virou best-seller e recebeu o Prêmio Jabuti na categoria "não-ficção". Em 2003, a obra ganhou as telas do cinema num filme do diretor Hector Babenco.

Seu outro livro, Nas ruas do Brás, foi agraciado na Feira Internacional do Livro de Bolonha, na Itália e também na Bienal do Livro do Rio de Janeiro, em 2001, na categoria "revelação de autor de literatura infantil". Já Florestas do Rio Negro foi indicado ao Prêmio Jabuti em 2002.

Se medir a inteligência de alguém já é tarefa inglória, imagine estimar seus valores médios em populações inteiras. Talvez não exista na biologia campo mais sujeito a interpretações contraditórias, preconceituosas e apaixonadas.
Em 1990, foi descrito o efeito Flynn, segundo o qual ocorrem aumentos significantes das médias do quociente de inteligência (QI) em curtos intervalos de tempo, à medida que as nações se desenvolvem.
Em 2001, Lynn e Vanhanen fizeram a primeira tentativa de relacionar inteligência com desenvolvimento econômico, ao publicar um estudo sobre o QI médio dos habitantes de 81 países.
Em 2005, N. Broder levantou a hipótese de que a inteligência, assim como outros traços psicológicos, é altamente plástica, portanto adaptável ao ambiente. Como consequência, tende a crescer com a escolaridade e com os desafios cognitivos impostos pelo meio, como os que surgem na migração do campo para a cidade.
Baseado no fato de que os níveis nacionais de QI são menores nos países com mortalidade infantil elevada e naqueles em que os bebês nascem com baixo peso, Broder concluiu que saúde e nutrição podem afetar a inteligência.
O que os estudos não esclarecem, no entanto, é se existe relação de causa e efeito entre essas variáveis, isto é, se a instrução ativa a inteligência ou se indivíduos mais inteligentes estudam mais. O mesmo vale para os que abandonam a agricultura para tentar a sorte na cidade.
Duas conclusões retiradas de vários estudos dão ideia da complexidade dessas interações:
1) O QI de uma população é menor nos países em que as temperaturas permanecem mais altas durante o inverno. Tem certa lógica: frio e neve exigem maior criatividade para sobreviver.
2) Como regra, quanto mais distante da Etiópia estiver o país, mais alto o QI de seus habitantes. Tem a mesma lógica: quanto mais se afastou da terra natal, mais desafios adaptativos o homem foi obrigado a vencer.
A você, leitor que resistiu com bravura à introdução, está reservada a cereja do bolo.
Cristopher Eppig e colaboradores escreveram um artigo na prestigiosa Proceedings of The Royal Society, propondo uma explicação unificadora, daquelas que nos deixa a sensação do por que não pensei nisso antes.
Segundo eles, as causas apresentadas estão por trás de uma variável bem mais relevante: as infecções parasitárias.
Do ponto de vista energético, o cérebro é o órgão do corpo humano que mais consome energia: 87% no recém-nascido, 44% aos cinco anos; 34% aos dez; 23% nos homens e 27% nas mulheres adultas.
As infecções parasitárias interferem com o equilíbrio energético: 1) alguns microrganismos se alimentam de tecidos humanos que precisam ser reparados. 2) outros vivem nos intestinos e prejudicam a absorção de nutrientes. 3) para multiplicar-se, os vírus dependem da maquinaria de reprodução da célula, processo que exige energia. 4) o hospedeiro infectado precisa investir energia para ativar o sistema imunológico; por longos períodos, nas infecções crônicas.
As diarreias na infância têm custo energético especialmente elevado. Primeiro, por causa da alta prevalência -estão entre as duas principais causas de óbitos em menores de cinco anos. Além disso, porque elas dificultam o aproveitamento de nutrientes.
Quadros diarréicos de repetição durante os primeiros cinco anos de vida podem privar o cérebro das calorias necessárias para o desenvolvimento pleno e comprometer a inteligência para sempre.
Diversos trabalhos demonstraram que infecções parasitárias e QI trilham caminhos opostos. Um deles, realizado no Brasil pelo grupo de Jardim-Botelho, mostrou que crianças escolares com ascaridíase apresentam performance mais medíocre nos testes de capacidade cognitiva. E, mais, naquelas parasitadas por mais de um verme intestinal os resultados são piores ainda.
A hipótese de que infecções parasitárias prejudicariam o desenvolvimento da inteligência explica porque a média do QI aumenta rapidamente quando um país se desenvolve (efeito Flynn), porque o QI é mais alto nas regiões em que o inverno é mais frio (menos parasitoses) e porque nos países pobres os valores médios do QI são mais baixos.
No Brasil, existem 38 milhões de residências sem esgoto.

Realmente é dolorosamente triste saber o quanto há ainda brasileiras e brasileiros e também latino-americanos vivendo em condições subumanas. Desejo a cada uma e cada um que o dia seja produtivo e reflexivo.

4 comentários:

  1. Querido Prof Chassot:
    Empenhada na escrita da minha dissertação deixei de passar por aqui alguns dias, mas hoje entrei pensando mesmo em buscar inspiração em suas palavras. Falas lindamente sobre a natureza. Me deu umas novas ideias...
    Parabéns pela escolha do texto de hoje, admiro muito o trabalho do Dráuzio Varela.
    Tenha uma semana iluminada!
    Bjo gordo,
    Neusa

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  2. Estimada colega Neusa,
    obrigado pela ‘passadinha querida’,
    Que bom que esse blogue catalisa novas ideias.
    Um afago do

    attico chassot

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  3. Querido Attico,

    Muito bom o texto do Dr. Dráuzio Varela. Ótima escolha.
    Bom começo de semana,
    Anna Ordobas

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  4. Muito querida Anna,
    obrigado por tua presença aqui e pela ratificação da escolha da blogada que abre a semana.
    Retribuo teus votos
    attico chassot

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