sexta-feira, 2 de julho de 2010

02.- Democracia no futebol? Não


Porto Alegre Ano 4 # 1429

Este blogue já estava postado, quando no Centro Universitário Metodista – IPA, recebemos consternados a notícia da morte do querido colega e amigo Atos, aos 41 anos – idade de meu filho mais velho – vítima de câncer no aparelho digestivo, deixa

filhos de 1 e 5 anos. Atos Prinz Falkenbach, ainda esse ano estivera em evento científico na Finlândia, na sua área, Ciências do Movimento Humano onde tinha doutorado pela Universidade Federal do Rio Grande do

Sul (2003). Era Professor Titular do Centro Universitário UNIVATES, docente do Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento e um dos professores mais destacados no Mestrado Profissional de Reabilitação e Inclusão, onde cedo o aprendi a admirar, o convidado para ser da banca da Thaíssa Hass. O Seminário de Pesquisa de hoje foi suspenso, como também o seminário que eu daria a noite. Esta tarde, vou a Lajeado com meus colegas do IPA para o sepultamento do Atos. Nesse registro, a homenagem a um colega muito especial.

Mais uma sexta-feira em que os deuses do futebol comandam nossas agendas. Hoje, por exemplo, eles me privam pela segunda vez consecutiva do almoço com meu trio ABC. Certamente há de influir no Seminário da Pesquisa no Centro Universitário Metodista - IPA que começou ontem à noite com a excelente palestra da Prof. Dra Acácia Kuenzer (UFPR) sobre a ação de pesquisar. O seminário prossegue hoje (manhã e tarde) e amanhã.

Hoje à noite tenho uma fala no Mestrado Profissional de Reabilitação e Inclusão. Na disciplina de meus colegas Marlis Morosini Polidori e Ygor Arzeno Ferrão. Vou tentar

motivar mestrandos ao gostoso processo da escrita respondendo a três interrogantes que mais de uma vez estiveram presentes aqui. Por que escrevo? O que escrevo? Como escrevo? Iluminará a discussão a máxima de Pablo Neruda (Parral, 1904 — Santiago, 1973) poeta chileno, um dos mais importantes poetas da língua castelhana do século 20 e cônsul do Chile na Espanha (1934 — 1938) e no México, Nobel em literatura em 1971.

Esta manhã, estarei muito em espírito na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – Campus de Jequié, no Programa de Pós-Graduação em Química, na torcida pela minha querida colega e amiga Joelia Martins Barros, que orientada pelo Prof. Dr. Marcos de Almeida Bezerra, defende sua dissertação de mestrado. Neste trabalho se busca o desenvolvimento de um método com base na extração assistida por ultra som para determinação de cobre, manganês, níquel e zinco em amostras de rações para nutrição de frangos usando a espectrometria de absorção atômica com chama (FAAS).

Mesmo com essa caminhada na Química Analítica a Joélia é também uma batalhadora na área de Educação Química. Por duas vezes já estive em Jequié, na Bahia para participar de seu trabalho. Aliás, foi num destes convites, que vi pela primeira e única vez uma festa junina no Nordeste Brasileiro. Foi uma experiência muito bonita. Hoje vibro com o sucesso desta dedicada educadora, que também é muito presente como comentarista nesse blogue.

Mas adiro ao contágio destes dias futebol. Para o antropólogo e professor Édison

Gastaldo, na entrevista que concedeu, ao IHU On-Line, o futebol “é um caminho potencial para descobrirmos verdades profundas sobre a nossa cultura, sobre quem somos. Dentro de um campo de futebol, dramatizam-se valores e aspectos fundamentais do que significa ser brasileiro”. Gastaldo, professor no Departamento de Letras e Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio e Janeiro, diz ser a Copa do mundo o momento mais importante de celebração da nacionalidade brasileira. E explica: “isso aparece no índice de audiência das partidas do Brasil na Copa que tradicionalmente, ao longo de décadas, vem representando as maiores concentrações históricas de audiência midiática de todos os tempos. Uma partida do Brasil na Copa do Mundo concentra normalmente de 97 a 98% dos televisores ligados. Nenhum outro evento concentra tanta gente na frente da TV para ver a mesma coisa. É a hora em que todo mundo se veste de verde e amarelo, em que todo mundo canta o Hino Nacional, em que todos se abraçam, choram, vibram. Um jogo do Brasil na Copa do Mundo é o fato social total brasileiro. Concentram-se multidões de pessoas no mesmo lugar, em torno de um único valor: nós contra os outros. Por isso a Copa é tão importante. É o momento de ver quem somos frente aos outros, expresso na metonímia de que 11 pessoas são o Brasil”.

Enquanto Gastaldo e eu éramos professores da Unisinos, em mais de uma oportunidade, conversamos sobre os temas que ele especialista. Assim reparto com meus leitores respostas a algumas perguntas que escolhi para esta sexta-feira que faz a muitos nervosos. Isso também que mostrar que, mesmo que não assista aos jogos, não sou alienado ao tema.

IHU On-Line - Qual a importância de discutir academicamente a Copa do Mundo?

Édison Gastaldo A Copa do Mundo é um momento extraordinariamente importante no estudo do futebol como um elemento de identidade nacional no Brasil. É o momento mais importante de celebração da nacionalidade brasileira. Isso aparece no índice de audiência das partidas do Brasil na Copa que tradicionalmente, ao longo de décadas, vem representando as maiores concentrações históricas de audiência midiática de todos os tempos. Uma partida do Brasil na Copa do Mundo concentra normalmente de 97 a 98% dos televisores ligados. Nenhum outro evento concentra tanta gente na frente da TV para ver a mesma coisa. É a hora em que todo mundo se veste de verde e amarelo, em que todo mundo canta o Hino Nacional, em que todos se abraçam, choram, vibram. Um jogo do Brasil na Copa do Mundo é o fato social total brasileiro. Concentram-se multidões de pessoas no mesmo lugar, em torno de um único valor: nós contra os outros. Por isso a Copa é tão importante. É o momento de ver quem somos frente aos outros, expresso na metonímia de que 11 pessoas são o Brasil.

IHU On-Line - O futebol tornou-se um importante elemento constitutivo das relações internacionais que já não podem ser resumidas a questões diplomáticas entre Estados? Como se dão essas relações através do futebol?

Édison Gastaldo – É preciso ter cautela nessa aproximação. O futebol representa as nações só em metáfora, nas figuras de linguagem. Aqueles onze jogadores não têm a bandeira do Brasil no peito. Eles têm o emblema da CBF. A FIFA não é a ONU. O futebol não é uma instância diplomática. Quem tem a dimensão da diplomacia internacional é a ONU. A FIFA organiza federações nacionais de práticas futebolísticas. Quando falamos que o Brasil vai jogar com a Argentina, temos que ter em mente que está jogando o time da CBF contra o time da AFA (Asociación del Fútbol Argentino). Tem um efeito simbólico de que aqueles ali somos nós. Mas eles são os jogadores do Ricardo Teixeira. Ele que escolhe o técnico, e este é quem escolhe os jogadores. E a CBF, como as outras associações de futebol, não prestam contas a governos, não representam o Brasil em termos práticos. Em termos simbólicos, sim. E essa metonímia é muito lucrativamente explorada pela FIFA, pela CBF e por todas as outras associações futebolísticas do mundo. As pessoas dizem que o futebol para as guerras, resolve os conflitos, e isso não é verdade. Às vezes isso pode acontecer, mas é uma circunstância especial de fatores. Por exemplo, a Coreia do Sul e a Coreia do Norte estão à beira de uma guerra. A Coreia do Norte afundou um barco sul-coreano e provocou uma forte tensão militar na fronteira dos dois países. E a Copa do mundo não amenizou em nada essa situação.

IHU On-Line - Quais são as articulações econômicas e diplomáticas que se fazem em torno do futebol? Existe uma visão política do futebol?

Édison Gastaldo – Não vamos sobrevalorizar o futebol. Seu grande valor como fato social está no campo simbólico, no que ele significa para as pessoas. Como um instrumento de ação política, ele tem valor relativo. Coincidentemente, todo ano de eleição para presidente no Brasil é ano de Copa do Mundo. Todo ano vem algum jornalista me perguntar se a Copa é de propósito em ano de eleição e se ela influencia no resultado das votações. A resposta é sempre a mesma: não. A Copa do Mundo não influencia o resultado da eleição. É preciso relativizar o tal “poder” do futebol, que é de reunir uma audiência absurdamente grande em frente a uma tela de TV e de que, naquele momento, as pessoas se sentem mais brasileiras do que em qualquer outro. A política do futebol é um pouco pior do que a política normal. Na política normal, temos chance de votar a cada quatro anos. No futebol não temos chance de votar para nada. Os sócios de um clube têm uma participação ínfima na vida política de seus clubes. Os clubes de futebol no Brasil e a própria CBF são entidades fechadas em termos de participação política. Por mais que os torcedores que resolvam pagar para ser sócios dos seus clubes gostariam de influir nos destinos da instituição, eles não podem. Dentro de cada clube, de cada federação e de cada confederação, existem vários mecanismos de barreira para intervenção política. Não é por outro motivo que Ricardo Teixeira está, há décadas, no comando do futebol brasileiro. Ninguém vai conseguir tirar ele de lá enquanto ele não quiser sair. Ricardo Teixeira é genro do João Havelange, que foi, durante 28 anos, presidente da FIFA e, antes do Ricardo Teixeira, era ele o presidente da Confederação Brasileira de Desportos - CBD. Tanto é pequena a participação política que o sujeito foi presidente por décadas da CBD, saiu diretamente para a presidência da FIFA e deixou no seu lugar o seu genro. Ou seja, é uma questão de família.

IHU On-Line – Então podemos dizer que na política do futebol a democracia passa longe?

Édison Gastaldo Muito.

Quem interessar a integra desta entrevista pode encontrá-la em www.amaivos.com.br Meus votos de uma boa torcida e lembrem-se não é o Brasil que enfrenta hoje a Holanda. São recrutas muito bem pagos pelo senhor Ricardo Teixeira e seus asseclas. Que a sexta seja a melhor, independente do resultado do futebol. Amanhã a dica de leitura volta à África.

8 comentários:

  1. Ola Mestre Chassot! Eliminados na Copa, voltemos ao cotidiano. Sou um admirador da Prof. Acacia Kuenzer. Conheci-a através do SENAI e pude estar com ela no ano passado num Seminario na Feevale. Registrei isso em meu Blog http://profjairobrasil.blogspot.com/2009/09/discutindo-educacao-profissional-em.html Gostei bastante da exposiçao do professor Edison Gastaldo a respeito do futebol, principalmente porque ele nos coloca diante de realidades que nesse momento muitas vezes nao reconhecemos. Quero tua autorizaçáo para divulgar parte da blogada em minha ediçao desta semana. Abraço JB.

    ResponderExcluir
  2. THAÍSSA HAAS escreveu

    Professor Attico.
    Divido com o senhor essa dor. Desde que recebi seu email só fiz me emocionar e relembrar alguns momentos. Momentos estes que tive o privilégio de muito aprender com o professor Attos, bem como de descontração. Todos de forma muito afetiva e construtiva. Foi o professor do último seminário que cursei do Mestrado. Certa vez, em um intervalo, ele me disse, na praça de alimentação, que meu projeto merecia um livro e que eu e o senhor não poderíamos deixar que ficasse apenas na biblioteca do IPA como uma dissertação apenas. Isso demonstra o quanto ele incentivava e acreditava nos seus alunos e admirava seus colegas, sem picuinhas e sem competições de vaidade. Era um dos poucos professores do Mestrado que podia receber bem e ensinar para os profissionais das variadas áreas da RI. Circulava com humildade entre a Ed. Física, a T.O., a Pedagogia, a Psicologia, a Fisioterapia, a Enfermagem, a Medicina e todas as outras áreas que a RI envolve. Sempre acrescentando e querendo aprender com a gente. Respeitando o profissional que ali estava.
    Estou chocada. Não só pela perda do professor que tanto admiro, mas pela família que ele deixa. Que grande perda pra essas crianças de 1 e 5 anos. Era um pai que falava com alegria dos filhos, com afeto! E é uma pena que eles não vão poder conviver com uma pessoa tão brilhante como o pai deles foi. Vai fazer muita falta. Precisamos de pessoas assim...e não é justo que elas tenham que ir embora.
    Triste.
    Thaíssa

    ResponderExcluir
  3. Muito querida e com razão sofrida Thaíssa,
    ~~ mesmo que me fizeste uma mensagem pessoal a fiz pública levando-a comentário e também faço a resposta no comentário publicado ~~
    li tua mensagem, quase 21h, quando retornava de Lajeado, do sepultamento do Atos. Permita-me dizer de nosso Atos. O quadro mais doloroso era ver aquela jovem mulher dolorosa com um menino de cinco anos vendo seu pai sendo enterrado (não em sentido metafórico) e uma menina de um ano, não entendendo nada do que se passava.
    Realmente perdemos alguém que fora (é doloroso usar o tempo verbal no passado) importante no Mestrado Profissional de Reabilitação e Inclusão. Ele foi importante em nossa história.
    Alio-me a tua dor e lamento pela mãe que ficou com as duas crianças.
    Um afago com admiração
    attico chassot

    ResponderExcluir
  4. Meu caro Jairo,
    realmente já se passaram mais de três semanas desta anestesia futebolística. Agora caímos na real. Estás autorizados a publicar excertos de hoje, Talvez é importante referir www.amaivos.combr como fonte;
    Adiro a tua avaliação sobre a Profa. Acácia Kuenzer, que tive o privilégio de ter como colega no Centro Universitário Metodista - IPA até há dois anos.
    Agora, torçamos pela Argentina. Para mostrar a virada de Maradona.
    Um bom fim de semana

    attico chassot

    ResponderExcluir
  5. Estimado Chassot,
    Sinto muito pela morte do professor Atos. Ás vezes, não compreendo porque pessoas boas nos deixam quando temos tantas pessoas que não fariam falta nenhuma (pedófilos, drogados e estupradores principalmente ) e ainda estão entre nós.
    Minha defesa foi ótima! Apresentei com tranquilidade e consegui responder todas as perguntas realizadas pela banca. Sabe Chassot, como sou da àrea de Ensino, tive que estudar bastante , acabei me envolvendo e gostando muito do meu trabalho. Mas foi preciso muita dedicação. Obrigada por comentar no seu tão apreciado blog, pela torcida e pelos elogios.
    Adorei a entrevista com Édison Gastaldo, tirei algumas dúvidas que tinha a respeito da copa. O Brasil não venceu a copa, mas tudo bem. A vida continua.
    Abraços com saudades e mais uma vez, muito obrigada.

    ResponderExcluir
  6. Muito querida colega Joélia,
    quando se acompanha mortes como a do Atos parece que perdemos um pouco a crença num Criador que é tão incoerente na seleção daqueles em que chama para si. Por que desprover duas crianças de um pai?
    Realmente o futebol é máquina milionária. Li hoje que ele movimenta algo como 30% do PIB da Austrália.
    Agora, o mais importante deste comentário: parabéns pelo êxito em tua defesa. Vibro. Faço um prognóstico: o doutorado será em Educação.
    Um afago com admiração do
    attico chassot

    ResponderExcluir
  7. Olá!
    Sou formanda da graduação em Educação Física pelo Centro Universitário Univates e consequentemente aluna e admiradora do professor Atos. Nós alunos, ficamos chocados com esta perda rápida...na outra semana ainda tive aula com ele, mas percebíamos que ele estava diferente e sem forças...Estamos inconformados, mas com certeza seus ensinamentos estão cada dia ,mais vivos em nossas memórias!
    Um abraço, Vanessa Dall Orsoletta Brandt

    ResponderExcluir
  8. Estimada Vanessa
    ~~ faço cópia para a Prof. Dra. Ieda (meu único contato na Univates, por falta de teu endereço. Talvez ela possa repassar para alguém da Educação Física ~~
    Realmente foi uma perda inesperada e muito preciosa. Posso avaliar o quanto vocês alunas e alunos devem ter ficado sensibilizado com o lamentável 2 de julho. Estive no sepultamento e não cessa de me atravessar a cena dolorosa da esposa com o menino e menina enterrando o esposo e o pai. Dizes bem: hão de ficar as sábias lições do querido Atos, um mestre sábio e querido.
    Obrigado por externares aqui teu reconhecimento,
    Com admiração
    attico chassot

    ResponderExcluir