quarta-feira, 12 de maio de 2010

12* Teorema de Fermat... e uma boa dica


Porto Alegre Ano 4 # 1378

A postagem da edição desta quarta-feira é feita em horário antecipado, pois às 06h estarei na rodoviária para partir para Rio Grande, onde devo chegar quase 5h depois, percorrendo 320 km. Tenho na “Noiva do Mar” hoje e amanhã três atividades acadêmicas. Sobre a cidade e os eventos que me levam ao único porto marítimo do Rio Grande do Sul, comento aqui amanhã.

A blogada de hoje pode ser considerada a terceira da série Operação ‘engorda Lattes’ iniciada segunda-feira. Como ontem, trago mais um exemplo que está no texto O fetiche de quantidade” de Renato Mezan, publicado no caderno Mais, da Folha de S. Paulo dia 09MAI2010. Depois de vermos o trabalho de Needham como excelente argumentação para mostrar a fetichização de "artigo em revista"

em detrimento de textos de maior fôlego, hoje me aposso de considerações que o autor faz, trazidas do livro "O Último Teorema de Fermat" (SINGH, Simon. Rio de Janeiro: Record, 1999, 323 p. ISBN: 85-01-05006-7).

A tese é a mesma de ontem: para elaboração de trabalhos mais densos, às vezes, são necessários anos de um laborar paciente. Eis uma exemplificação primorosa presente no texto de Mezan (e mais ele, ainda apresenta uma excelente dica para orientandos e orientadores de teses e dissertações, que vale conferir):

O teorema de Fermat desafiou os matemáticos por mais de três séculos, até ser demonstrado em 1994 pelo britânico Andrew Wiles. O livro de Singh narra a história do problema, cujo fascínio consiste em ser compreensível para qualquer ginasiano e, ao mesmo tempo, ter uma solução extremamente complexa. Em resumo, trata-se de uma variante do teorema de Pitágoras: "Em todo triângulo retângulo, a soma do quadrado dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa", ou, em linguagem matemática, a²=b²+c².
Lendo sobre esta expressão na "Aritmética" de Diofante (século 3º), o francês Pierre de Fermat (1601-65)

– cuja especialidade era a teoria dos números e que, junto com Pascal, determinou as leis da probabilidade – teve a curiosidade de saber se a relação valia para outras potências: x³= 3³ + z3, x4 = y4 + z4 e assim por diante. Não conseguindo encontrar nenhum trio de números que satisfizesse as condições da equação, formulou o teorema que acabou levando seu nome -"Não existem soluções inteiras para ela, se o valor de n for maior que 2"- e anotou na página do livro: "Encontrei uma demonstração maravilhosa para esta proposição, mas esta margem é estreita demais para que eu a possa escrever aqui".
Após a morte de Fermat, seu filho publicou uma edição da obra grega com as observações do pai. Como o problema parecia simples, os matemáticos lançaram-se à tarefa de o resolver – e descobriram que era muitíssimo complicado.
Singh conta como inúmeros deles fracassaram ao longo dos 300 anos seguintes; os avanços foram lentíssimos, um conseguindo provar que o teorema era válido para a potência 3, outro (cem anos depois) para 5 etc. O enigma resistia a todas as tentativas de demonstração e acabou sendo conhecido como "o monte Everest da matemática". É quase certo que Fermat se equivocou ao pensar que dispunha da prova, que exige conceitos e técnicas muito mais complexos que os disponíveis na sua época.
Quem a descobriu foi Andrew Wiles, [
na foto] e a história de como o fez é

um forte argumento a favor da posição que defendo. O professor de Princeton [universidade estadunidense] precisou de sete anos de cálculos e teve de criar pontes entre ramos inteiramente diferentes da disciplina, numa epopeia intelectual que Singh descreve com grande habilidade e clareza. Não é o caso de descrever aqui os passos que o levaram à vitória; quero ressaltar somente que, não tendo de apresentar projetos nem relatórios, publicando pouquíssimo durante sete anos e se retirando do "circuito interminável de reuniões científicas", Wiles pôde concentrar-se com exclusividade no que estava fazendo.
Por exemplo, passou um ano inteiro revisando tudo o que já se tentara desde o século 18 e outro tanto para dominar certas ferramentas matemáticas com as quais tinha pouca familiaridade, mas indispensáveis para a estratégia que decidiu seguir. Questionado por Singh sobre seu método de trabalho, Wiles respondeu: "
É necessário ter concentração total. Depois, você para. Então parece ocorrer uma espécie de relaxamento, durante o qual, aparentemente, o inconsciente assume o controle. É aí que surgem as ideias novas".
Este processo é bem conhecido e costumo recomendá-lo a meus orientandos: absorver o máximo de informações e deixá-las "flutuar" até que apareça algum padrão, ou uma ligação entre coisas que aparentemente nada têm a ver uma com a outra. Uma variante da livre associação, em suma.
Ora, se está correndo contra o relógio, como o estudante pode se permitir isso? A chance de ter o "estalo de Vieira" é reduzida; o mais provável é que se conforme com as ideias já estabelecidas, o que obviamente diminui o potencial de inovação do seu trabalho

Adito meus votos de uma venturosa quarta-feira. Queiram os deuses que amanhã possamos nos ler aqui, eu escrevendo desde Rio Grande.

2 comentários:

  1. Muy querido Profesor Chassot,
    Tiene mucha razón en su texto, ¿quién no se ha acostado pensando en un problema y se ha despertado con la solución del mismo? El inconsciente sigue trabajando, aunque nosotros durmamos.
    Que tenga un buena jornada de trabajo,

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  2. Estimada Matilde,
    muito obrigado por tão precioso comentário. Respondo-te quando há não muito da jornada maratonística. Assim dou dormir para deixar o inconsciente trabalhar,
    Com agradecimentos

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