quarta-feira, 28 de abril de 2010

28 * Uma santa indignação

Porto Alegre Ano 4 # 1364

Hoje os calendários celebram o Dia da Educação, dia da Segurança no Trabalho e dia da Sogra. Elejo este último para comemorar e assim homenagear a Liba, uma muito querida e dinâmica Sogra, também uma das mais fiel leitora desse blogue. É para ela essa edição.

Preparei esta blogada no ocaso da noite de terça-feira, quando recém chegava do nono (de 18) encontros de Prática Pedagógica do Curso de Filosofia do Centro Universitário Metodista – IPA. Vibro, pois como em outros sete encontros 100% dos alunos estavam presentes. Apenas em um dos encontros faltou um aluno. Tivemos mais uma aula muito produtivo. No Morro Milenar essa noite já estava frio. Alegro-me com o término das chuvas, e aguardemos o anunciado frio. Acontece a manhã mais fria do ano em Porto Alegre: 9,7ºC. Para quem conviveu este ano em fevereiro, em Ålborg , temperaturas de –14ºC, ainda está ameno.

Todos têm na vida momentos de indignação. Há até aqueles que falam em santa indignação. Não entendendo como até o pecado da inveja é, de vez em vez, santificado. Não sei quando a inveja é santa. Por referir-me a Santa, ontem foi o dia de santa Zita.

Eis o que diz o ‘santo do dia’ que recebo diariamente: Santa Zita, Virgem (+ Luca, 1278) Foi durante 40 anos criada de uma família nobre na cidade italiana de Luca. Distribuía aos pobres o pouco que lhe sobrava do salário recebido. Sua santidade foi reconhecida ainda em vida, e confirmada por grande número de milagres. É padroeira das empregadas domésticas e patrona de Luca. Foi a Fernanda, que duas vezes por semana cuida com muita dedicação da Morada dos Afagos que me lembrou que era o dia de sua padroeira. Por favor, não me rotulem de ser uma vez de igrejeiro, como ocorreu com a blogada de São Jorge.

Mas ontem, à tarde para mim, ao invés de Santa Zita, fi-lo dia de Santa Indignação. Há lugares, em nosso mundo real. Que resistimos a ir. Recordo, quando era professor da rede estadual detestava ir à Secretaria de Educação. Sempre me sentia mal atendido. Outro lugar que detesto ir é a cartórios, para reconhecimento de firma ou assemelhados. Talvez porque os cartórios sejam para mim (e para muitas pessoas ) locais onde sempre nos sentimos lesados pelo tipo de serviços – aparentemente – desnecessários que prestam, pelos quais sempre nos sentimos extorquidos não no preço, mas em exigências descabidas. Eles são autenticadores dizendo que documentos ou assinaturas são verdadeiros. Isso seria totalmente desnecessário se não houvesse desonestos.

Pois na tarde desta terça-feira realizei algo que já protelava há alguns dias: o INSS em um processo que tenho em tramitação pede uma prova que tenho habilitação para ser professor, pois talvez eu possa ter exercido todo esse tempo a profissão de professor como um charlatão. Mas não basta uma cópia do diploma, precisa ser autenticada em cartório. Pois a cópia de diploma que tenho pode ser falsificada. Assim precisei fazer uma cópia autenticada.

Pois esse foi meu feito sacrifical da tarde de ontem. Afortunadamente, a duas quadras de minha casa há um tabelionato. Lá me fui, achando que em poucos minutos me desincumbiria da tarefa já, há uns dias, protelada.

Havia uma pequena multidão, mas para cópia e autenticação a fila era pequena. Uma senhora a minha frente autenticava um documento, que eu nem sabia existir: ‘Certificado de Quilometragem Verdadeira’. Como podem existir carros que tenham sua quilometragem adulterada, então deve haver um órgão que emite tal certificado, algo como um diploma, que depois um cartório autentica.

Chegou a minha vez: entreguei meus documentos. Dois diplomas (um de licenciado em Química e outro de Doutor em Ciências Humana) – assim o INSS me reconhecerá como professor, carteira de identidade e carteiro do trabalho. Como três eram frente e verso, um total de sete cópias. Contra a entrega dos documentos, recebi uma ficha para ir ao caixa aguardar a chamada para o pagamento.

O funcionário que recebeu os 4 documentos passou para outro funcionário que emitiu uma guia,discriminando 7 cópias, 7 autenticações, 7 selos digitais e mais ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza). Os dois foram juntos a uma fotocopiadora e enquanto conversaram animadamente, às minhas vistas (e impaciência), durante 17 minutos, fizeram as cópias; um serviço que poderia ser feito talvez em cinco minutos.

Terminado esse oneroso serviço, ou dos funcionários levou os originais e cópias a uma mesa onde trabalhavam cinco burocratas. Meus documentos foram colocados em ultimo lugar de uma pilha. Depois de seis minutos (não havia muitos acima) chegou a vez dos meus. Um dos funcionários os tomou, e enquanto contava algo muito jocoso ao seu colega, os separou em dois grupos: um de originais que foram clipsados e outro com as cópias, também clipsados. Os dois conjuntos foram passados para o colega que contava a história, que não interropeu a narrativa, mas apensou em cada cópia dois carimbos: um retangular grande e outro redondo pequeno. Os dois conjuntos foram passados para um terceiro funcionário, que contou o número de cópias e o numero de originais e apôs uma assinatura no carimbo grande. Passou então para um quarto funcionário que colocou cinco selos digitais em cópias e dois selos na guia demonstrativa dos serviços prestados. Depois meus dois conjuntos de documentos foram encaminhados ao caixa, colocados mais uma vez no final da pilha. Quando foi chamado meu número, paguei R$ 22,73 e recebi meus originais com as cópias autenticadas portadoras de um chamado selo digital.

Como podem ver, tinha razão para fazer-me indignado. Sentir-se lesado é algo que incomoda. Nem sempre pode ser ter a tolerância de uma Santa Zita. Tudo logo foi esquecido, pois em casa deleitem-me na escrita de um texto que preparo para uma fala na Universidade de Rio Grande para participar do Seminário Perspectivas de Investigação no Campo da Educação Ambiental e Educação em Ciências, em maio. Desejo que essa quarta-feira seja a melhor para cada uma e cada um. Espero amanhã trazer algo mais agradável.

14 comentários:

  1. Mestre Chassot! Minha solidariedade na tua indignaçao, pois os cartórios tambem me proporcionam azia e má digestão. Sabes que há uma lei em tramitaçao no Congresso para amenizar um pouco essa farra dos cartórios, pois historicamente essa atividade é herdada desde os tempos da invasão lusitana por aqui. Essa atividade foi trazida pela Corte e se perpetua da mesma forma até hoje. Na nova lei dos cartorios a seleçao será feita por concurso, aumentando a concorrencia e reduzindo quem sabe os preços aviltantes cobrados. Duas coisas m deixam indignado, cartório e pedágio. Abraço do JB

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  2. Meu caro Jairo,
    obrigado por te aliares a ‘santa indignação’ contra os cartórios. Os pedágios são escorchantes, mas além serem concedidos ao poder privado algo que foi feito com dinheiro publico, as arrecadadores mantêm as rodovias. Mas os cartórios – como tu lembras com propriedade, herdados desde o tempo das Capitanias Hereditárias – são transferidos familiarmente e mais não prestam nenhum serviço útil. Cobram sem produzir algo em troca.
    Tomara que a nova lei faça algo.
    Um muito boa terça-feira e obrigado pelo comentário
    attico chassot

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  3. Querido Chassot,
    Parabéns para família Chassot! Quanta comemoração uma proxima da outra!
    Saudades!!!

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  4. Joelia querida,
    muito obrigado, Foi quase como as festas juninas aí em Jequié.
    Um afago com saudades.
    attico chassot

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  5. Muy querido Profesor Chassot,
    Su blog de hoy parece un cuento costumbrista-surrealista (increíble que la lógica burocrática nos coloca en situaciones inverosímiles por absurdas).
    A pesar del hecho que le produjo santa -y justa- indignación, celebro que le haya servido de inspiración, ¡resulta un cuento muy bien narrado!!! Debería seriamente pensar en escribir literatura, tiene madera de escritor.
    Que tenga un lindo día,

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  6. Muy apreciada Matilde,
    gracias; tus comentarios me desvanecen. Exactamente como dices: la lógica burócrata nos hace peonzas en sus manos. Ellos nos maniobran. Cuanto tu sugestión de escribir literatura, parece que como bloguista tengo un universo de lectores tan pequeño que seria audacias buscas más.
    Agradezco tan laudatorio comentario,
    con amistad

    attico chassot

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  7. Mestre, parabéns por esse dia da Educação, pois o sr personifica para mim e para todos os seus leitores, para seus ex, atuais e futuros alunos e orientandos, um verdadeiro arauto da educação brasileira. Pena que em nosso país a educação e os seus educadores sejam tão desconsiderados, que, mesmo eu sendo uma educadora, só fiquei sabendo hoje pelo seu blog da existência deste dia tão importante. Quem sabe daqui a uns 500 anos (espero que nem tanto), seja um dia verdadeiramente comemorado com os louvores merecidos.
    Abraços e parabéns a todos os seus leitores-educadores.
    Maria Lucia

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  8. Muito estimada Maria Lúcia,
    me comoveste com tua mensagem. Ela poderia ter o título da blogada de hoje, Indignas-te pela irrelevância dada ao “Dia de Educação”, Penso que essa data não tem celebração especial, pois não ouvi qualquer referência.
    Aliás, há uma super inflação de “Dia de...”.
    Por outro lado sensibilizo-me quando me fazes arauto da Educação Brasileira. Tu só me conheces deste blogue, Talvez– não,certamente – também aí haja exageros teu.
    Mas, imerecida e comovidamente, obrigado
    attico chassot

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  9. Mestre Chassot, não creio que a Maria Lúcia tenha exagerado. Pelo contrário, acho que ela verbalizou o que muitos de nós pensamos, mas nem sempre temos a oportunidade de dizer. Portanto, faço eco às palavras dela.

    Quanto a sua experiência de hoje, parece-me que há uma diferença muito tênue entre a burocracia e a burrocracia. O que me deixa mais indignado é essa exigência estapafúrdia de tudo em 3 vias. Já parou para imaginar que, com isso, consumimos duas vezes mais papel do que seria necessário para obtermos um outro pedaço de papel autenticado? Mas, como diziam os juristas romanos: Dura Lex Sed Lexc(A Lei é dura, mas é Lei).

    Ótimo dia.

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  10. Meu caro Marcos,
    só na quinta-feira tomo conhecimento de teu comentário de ontem. Obrigado, por tua generosidade em fazer eco as exageradas referência da Maria Lúcia (que recebe cópia desse comentário).
    Realmente nosso imaginário é sempre burra a burocracia (bem definida no Houaiss: sistema de execução da atividade pública, especialmente da administração, por meio de um corpo complexo de funcionários lotados em órgãos, secretarias, departamentos etc., com cargos bem definidos, selecionados e treinados com base em qualificações técnicas e profissionais, os quais se pautam por um regulamento fixo, determinada rotina e uma hierarquia com linhas de autoridade e responsabilidade bem demarcadas, gozando de estabilidade no emprego).
    Tu como historiador deves saber que no Brasil já houve um Ministério da Desburocratização (até para acabar com as três vias).
    Obrigado, uma vez mais, por aderires aos exageros da Maria Lúcia,
    attico chassot

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  11. Professor...perdão pelo atraso ao comentar esta sua postagem, mas dia de 4ªfeira saio pela manhã e só retorno à noite, exausta, e praticamente nem ligo o PC...mas não é por causa do atraso que minha solidariedade por tua indignação seja diminuída!
    Sempre comento tuas postagens com meu marido, mesmo ele não sendo professor, muito menos Químico[rsss]e, ao relatar à pouco esta postagem, vendo-o também indignado pela situação narrada pelo senhor, e pela insignificância que nós professores temos sido acometidos atualmente aparentemente mais que o normal, a única frase que ele 'soltou' foi: "É possível alguém não saber quem é o Chassot?!" E, confesso que concordo com ele!
    E, como dizem meus alunos, "fala sério"!!!Quase R$23 por cópias e autenticação?! Que absurdo!!!
    ...

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  12. Muito querida Thaiza,
    obrigado pela solidariedade tua e de teu marido (e diz para ele que a maioria das pessoas, mesmo no meu entorno não sabem quem é o Chassot). Ontem, nesta mesma blogada tive que dizer nos comentários da Maria Lúcia e do Marco o quanto exageram.
    Um afago agradecido,
    attico chassot

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  13. Olá, Professor. Nós, seus eternos alunos, autenticamos sua profissão de Educador!

    Sabe o que mais me incomoda, além da burocracia, nestes cartórios, secretarias e afins?? Os funcionários não te olham, eles não olham para quem atendem! Sinto como se estivesse eu sendo carimbada e renomeada a um número!! Argggh

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  14. Muito querida Marília,
    obrigado por generosidade te aderires à Maria Lucia, ao Marcos, à Thaisa. Vocês são queridos de mais, mas, às vezes, um pouco ceguinhos.
    Pareceu-me genial tua metáfora de ‘sentir-te carimbada’.
    Acredito, que isso aí: seguinte: carimbo! O próximo...
    Um afago carinhoso do
    attico chassot

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