segunda-feira, 26 de abril de 2010

26 * Sobre correspondências

Porto Alegre Ano 4 # 1362

Começamos a última semana de abril. As chuvas parecem que pararam, mas a umidade relativa do ar é 100%. O chuvoso domingo de ontem, mesmo com nuvens carrancudas teve ao anoitecer um azular para os gremistas.

Estes se dizem ser a metade dos gaúchos. Tenho defendido a tese que aqui não se nasce católico ou luterano (como acontecia, por exemplo, até recentemente com todos que nasciam na Suécia), nem cristão, judeu ou budista, e muito menos ateu. Aqui se nasce gremista ou colorado. Poderia se fazer um estudo de como o pai é definidor da futura ‘religião’ dos nascituros. Aliás, os gaúchos aquerenciados em outras plagas não fazem diferentes. Ontem meu amigo Edni, enviou-me a ‘certidão de nascimento’ de seu neto Gael, nascido em Bilbao, na Espanha, em 5 de abril. Vejam que ele não usa a camiseta do Athletic de Bilbao.

Nesse fim de semana encerramos ciclo dos aniversários abrilinos. Neste domingo, no intervalo do grenal. Cantamos parabéns para Maria Clara que nesta segunda-feira completamente queridamente quatro anos. Nas fotos dois momentos da festa.

É quase senso comum que hoje dedicamos menos tempo em leituras de livros – e aqui estou me referindo àquele genial artefato tecnológico que ontem foi central aqui.

Há uma justificativa para tal. Não é buscar desculpas, mas uma das razões está na quantidade de tempo que envolvemos em responder mensagens. Aqui estou excluindo aquelas, usualmente trabalhosas, que envolvem dar parecer em trabalhos de congressos e artigos de revistas, agora muito mais controlada pelos sistemas de referagem [palavra não dicionarizada, mas corrente na Academia, correspondente a arbitragem; se for incorporado esse anglicismo, sua origem refere-se à referee, juiz] on-line. Pode-se afirmar que se com o advento do correio eletrônico quase abandonamos as cartas pessoais manuscritas e envelopadas, muitas vezes longas e refinadas. Tornamo-nos muito mais escribas, agora, em mensagens pessoais. Trago dois exemplos de mensagens recebidas na semana que passou.

A primeira recebida pelo orkut: oi, o senhor não me conhece, porém atualmente estou estudando o livro do senhor a ciencia atraves dos tempos, o senhor poderia me fornecer uma sintese dos capitulos 1 e 2 (desde já agradeço). A antecipação dos agradecimentos foi desnecessária, pois pensei que o melhor seria não responder, pois não queria trazer a um meu leitor o destilar de minha indignação.

A segunda, de um dos leitores mais fiel deste blogue, que é também, um atuante líder sindical: Queria a tua opinião a cerca da remuneração de palestras. Vou fazer uma proposta, isto é, pretendo levantar uma discussão no sindicato sobre pagamento de palestrantes convidados. E preciso de alguns subsídios. Sei que você atende muitos convites sem se preocupar com a remuneração, muitas vezes só usufruindo da hospedagem e, é claro, a passagem. Mas haveria algum critério para remunerar palestrante? Como é que no exterior isso é feito? Em se tratando de palestras, mini-cursos, oficinas, como pagar aos profissionais dedicados a isso? Que sugestão você pode me dar para que eu subsidie minha proposição?

Como eu iria deixar de responder a tal pedido:

Meu querido amigo, escolheste um péssimo conselheiro. Toda vez que tenho que tratar de honorário de palestras, sou um trapalhão. Já disse que sonho em ter uma secretária que gerisse esse assunto por mim. Antecipo que nunca deixei de dar uma palestra por questão de remuneração. Já percebi pelas mesmas desde R$ 00,00 (quando não um valor negativo, pois não raro tenho valor não ressarcidas despesas mesmo quando não recebo nada) até mais de R$ 2.000,00.

Mas antes de comentar essa variabilidade, quero aditar outro comentário. Não temos entre nós a tradição de pagar por palestras. Em Porto Alegre, está para se iniciar a quarta edição do “Fronteiras do Pensamento” [www.fronteirasdopensamento.com.br]Eis a informação: o acesso ao curso de altos estudos se dará exclusivamente através da aquisição do Passaporte, que garante o acesso as 10 conferências realizadas na cidade de Porto Alegre/RS, no decorrer do ano de 2010. Investimento: R$ 675,00 (Passaporte para todas as conferências). Eu pessoalmente acho caro, até porque sou obrigado a comprar o pacote integral. Talvez se pudesse eleger uma ou duas pagaria, digamos R$ 70,00.

Eu tenho a impressão que em várias de minhas palestras, alguns as assistem parecendo que estão fazendo um favor para mim (ou constrangidos por algum professor), imagina se tivessem que pagar. Talvez para bem remunerar palestrantes tivesse que haver uma educação para o pagamento pela assistência a palestras;

Há uma de minhas palestras que já dei mais de uma centena de vezes (ainda devo fazer esse balanço): A Ciência é Masculina? É, sim senhora! Já tentei fazer uma venda casada do livro homônimo. Paga-se R$ 15,00 (que é o preço do livro) recebe o livro (com direito a autógrafo) e assiste a palestra. Nessa situação, se houver assegurado 100 aquisições não cobraria honorário algum (exceto as despesas de transporte e hospedagem). Com o desconto que recebo da editora (40%) me considero regiamente remunerado. Essa seria uma situação que me agradaria trabalhar com quaisquer de meus livros, pois significa também um retorno à Editora, que investiu em minha obra. Houve sucesso parcial em uma situação, pois depois de tudo acertado, uma grande universidade solicitou se não poderia cobrar menos pelos livros.

Sei que ainda não respondi a tua pergunta. Eis uma resposta liminar. Acredito que deveríamos ser remunerado por qualquer uma de nossas falas (palestras, mesa-redonda, mini-curso) como profissionais que se prepararam para transmitir o resultado de seus estudos. O valor do pagamento tem pelo menos duas variáveis: a primeira, a natureza da instituição para qual vendo (ou doo) minha força de trabalho e outra, a localização da atividade.

Para a primeira, trago dois exemplos antípodas: a) quanto dou cursos para a formação de professoras e professores dos acampamentos e assentamentos do MST; b) quando profiro palestra para uma instituição em fino hotel e esta é antecedida de um lauto café e sucedida por sofisticado almoço. No primeiro caso não cobro nada e no segundo deveria pedir os mais altos honorários.

Para o segundo, faz muito diferença no valor a ser cobrado a localização: há palestras que tomo uma lotação ou um taxi e em minutos estou no local. Outras há que viajo para ir e voltar duas noites consecutivas de ônibus ou, ainda outras, que viajo de avião com demoradas conexões. Nos honorários deveria estar incluído o tempo gasto desde a saída até o retorno a casa.

Há ainda outro detalhe acerca de recepção de honorários. As instituições que convidam, usualmente têm dificuldades burocráticas para pagar. Algo que dificulta é que não possa emitir nota fiscal, por que não tenho uma empresa. Para pagar a uma pessoa física há muitas exigências de documento, como provar que já recolhes já o teto para o INSS para não descontar uma vez mais. Há também o ‘esquecimento’ de fazer o depósito depois da palestra. Já tenho uma mensagem, mais ou menos padrão, que diz: Nunca mais tivemos troca de mensagem, quando me dou conta que já faz mais de um mês que tive a oportunidade de estar com vocês. Espero que tenham recebido dos participantes uma boa aceitação da palestra. Estou escrevendo, não sem certo constrangimento, para saber se o valor dos honorários já foi depositado.

Há outro dado: há muitas de minhas falas são inseridas dentro de congressos essas usualmente não tem remuneração, às vezes, a única benesse e não precisares pagar a inscrição. Mais um detalhe: universidades (especialmente as públicas) usualmente não remuneram nada. Quando te dão um certificado para colocares a fala no Lattes, se consideram isentas de outro compromisso com o palestrante. É também comum que ao invés de pagamento recebamos presentes: um vaso com uma folhagem, uma cesta com produtos típicos, anuários institucionais, que em geral ficam no hotel, pois são volumosos.

Quanto a tua interrogação acerca do exterior, tenho pouca experiência. Já recebi dinheiro e também já recebi apenas mimos.

Na alegria de começarmos juntos mais uma semana, votos de uma boa segunda-feira. Um convite: amanhã, muito provavelmente, mostro a rapidação da desatualização de um texto.

6 comentários:

  1. Mestre Chassot, depois de alguns dias sem conexão, volto a navegar pela grande rede.

    Sua blogada de hoje faz muitos paralelos com meu dia.

    Primeiro: a temática de hoje é sobre correspondências, e, acredito eu, não existe correspondência atual que se equipara à praticidade e à velocidade dos e-mails. Por estar sem conexão internética, o volume de correspondências em meu correio eletrônico era muito grande, algo que não aconteceria, por exemplo, se fossem em suporte papepl, sejam as tradicionais cartas ou os modernos(?) faxes.

    Segundo: o outro paralelo se deve a uma dúvida sobre honorários cobrados/recebidos por falas proferidas.O assunto, a meu ver, gira em torno da regulamentação, e isso se faz paralelo com um dos e-mails que recebi da ANPUH (Associação Nacional de História - antigamente conhecida como Associação Nacional dos Professores Universitários de História, de onde driva sua sigla permanente), que trata da regulamnetação e do reconhecimento da profissão Historiador.

    Esperemos que a semana seja menos chuvosa, pois as chuvas tem castigado toda a região sul do país.

    Ótimo dia.

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  2. Meu caro Marcos,
    primeiro celebrar a tua volta. Tu me acostumaste mal e tua ausência me fez interrogante. Levantei hipóteses. Terias ficado desagradado coam discreta referência que fiz no ‘Dia de São Jorge: o santo padroeiro dos jogadores de RPG; esta informação é trazida como homenagem a ativo comentarista deste blogue’. Assim tenho a festejar a tua volta. É difícil imaginar-te desconectado. Para mim seria quase insuportável. A esse propósito te antecipo o provável encerramento da blogada de amanhã que há não muito lapidava: “Muito a propósito de sedução trago uma questão: o quanto o tempo que estamos conectados à rede tem outra sedução Com dimensões diferentes. Parece que temos aí um bom exemplo de como. Então, somos regidos por Cairos, ou invés de ser por Cronos. Pensem nisso e até amanhã, com desejos que essa terça-feira seja a melhor,”
    No novo suporte que temos para nos corresponder é claro que escrevemos mais. Se te deres conta do número de mensagens que nós dois trocamos nesse período que te fizeste comentarista tão competente deste blogue (talvez 2 x 400 mensagens). Isso seria insuportável em tempos que se envia matéria e não bits.
    Não entendi bem a relação do reconhecimento da profissão de historiador com o comentário de honorários.
    Uma vez mais festejo teu retorno, sei que fizeste falta
    attico chassot

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  3. Mestre Chassot, o paralelo que fiz foi entre a regulamentação da profissão do Historiador com uma regulamnetação do pagamento de honorários em algumas falas, como uma tabelação de acordo com o tipo de instituição, o "nível" do palestrante e o tempo de duração.

    Quanto à ligação entre o RPG e São Jorge, e a menção feita a mim, de forma alguma isso seria motivo de afastamento do blogue. Muito antes pelo contrário, é um motivo de agradecimento pela dupla lmebrança: a mim, como o referido "ativo comentarista deste blogue", ao RPG, que é, além do meu hobbie favorito, minha temática de pesquisa e minha ferramenta de militância por uma renovação na metodologia do ensino da História.

    Ótimo dia.

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  4. Meu caro Marcos,
    obrigado por esta volta em dose dupla.
    Valeu o esclarecimento. Quanto ao RPG, permito-me, cerimoniosamente, recordar uma dívida aos nossos leitores: um texto sobre o tema para alfabetizar um universo de leitores acerca do que dizes ser “meu hobbie favorito, minha temática de pesquisa e minha ferramenta de militância por uma renovação na metodologia do ensino da História”
    Com expectativa

    attico chassot

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  5. Verdade, eu estou em débito com essa promessa. Providenciarei, o mais rápido possível, um texto curto, porém elucidativo, sobre o tema.

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  6. Muito caro Marcos,
    em meu nome e de meus atentos leitores antecipamos agradecimentos.
    Com expectativa
    attico chassot

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