quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

30*Uma blogada que sabe a maresia

Porto Alegre Ano 4 # 1245

Esta já uma blogada de quase despedida de 2009. Mesmo que seja madrugada a temperatura já chega a 29 graus se anunciando 40 graus para hoje. É a ultima da Morada dos Afagos, local de maioria delas, mesmo que neste ano houvesse de dezenas de outros locais em vários estados do Brasil e também da Espanha e da Colômbia. Amanhã volto ao cenário de duas edições dezembrinas no ano passado: praia de Atlântida. Ela fica acerca de 150 km de Porto Alegre. Na programação desenhada para os queridos hóspedes parisienses – já apresentados aqui no domingo e ontem – está fazer a virada 2009/10 na praia.

Assim dentro de mais um pouco com a Gelsa vou ao litoral. Há um ano escrevi aqui que quebrava um jejum que remontava ao século passado. Esse reencontro com praia, previsto para daqui mais um pouco, me vez rever blogadas do ano passado onde trouxe evocações sobre minhas relações com aquilo que em nossa cultura se denomina ‘ir à praia’.

Permito-me revisitá-las, por fazer desse espaço também cenário onde amealho minhas evocações, fazer hoje aqui uma mirada nessa dimensão de minha história. Também quase posso supor que os leitores em menor número desses dias podem ter se renovado no período de um ano. Assim a blogada de hoje terá sabor de café requentado apenas para alguns.

Pensei, como há um ano, que essas reminiscências poderiam ser revisitada em quatro tempos marcadamente distintos. Mas antes de visitá-los quero fazer uma prosaica distinção.

Essa distinção se faz clara ante uma afirmação aparentemente paradoxal: ‘Não gosto de ir à praia, mas amo o mar!’. Não gosto do ritual, que fez parte de minha história, de em uma parte do verão, transferir residência para uma casa de praia – usualmente com menos conforto da casa da cidade – e então, a cada manhã, untar-se de protetores, deslocar-se com cadeiras, guarda-sol e outras tralhas para a orla, disputar um território para montar acampamento e receber a areia distribuída pelo vento. Assim, detesto praia. Adoro o mar.

Quando viajo, se há mar busco visitá-lo. Molhar simplesmente os pés parece ser uma benção. Recordo, por exemplo, quando vi o Pacífico pela primeira vez (e única, por enquanto!), em 26 de dezembro de 1995, na praia de Miraflores, junto da estátua ‘El beso’ no Peru. Este ano no meu périplo colombiano e rápida chegadinha no Equador, não vi o Pacífico. De outra maneira, sinto ainda o gosto de uma cerveja que tomei em fugazes horas do dia 02 de agosto de 1989, na badaladíssima praia de Cannes.

Já contei aqui de meus sonhos de terminar meus dias (isso dá certo susto ou pelo menos um arrepio na alma) em pequena ilha onde tenha uma rede para ler meus livros, ouvir minhas músicas e nada mais. Como nesse ano darwiniano que se encerra visitei Galápagos muitas vezes, me agradaria que esses sonhos fossem em ilhota das 56 que compõem o famoso arquipélago;

Chega de futurições vou retomar escritas e olhar, como há um ano, o meu passado sua relação com a praia. Como então, faço isso, usando quatro marcadores temporais.

Do primeiro tempo lembro muito pouco e ele está associado aos anos seminarísticos em Gravataí. Conheci o mar no começo dos anos 50s, quando fizemos uma excursão de um dia, quando Padre Grings, amante do grego falecido no ano passado, nos ensinou a bradar: “Talassa! Talassa!’ quando avistássemos o mar, assim como ocorre na saga narrada na Odisséia. Tenho ainda uma vaga recordação que em um ano, (talvez 1952 ou 1953) passei uns dias férias (talvez uma semana) em uma casa que a Arquidiocese de Porto Alegre mantinha em Cidreira ou Quintão. Mas disso não consigo evocar quase nada.

O segundo tempo, nos anos 60s corresponde a quando meus pais, em uma ou duas temporadas alugaram uma casa em Tramandaí, para ‘ir para às praias’ como diziam. Eu já era professor, e vivia então a oportunidade de me reintegrar à vida familiar. Recordo que, por razões econômicas, a casa era precária e ficava muito distante do mar. Lembro de longas caminhadas subindo e descendo cômoros para ir/vir à praia. Duas lembranças de então. Minha mãe se queixando do trabalho a mais que a temporada lhe impunha, pois tinha que cozinhar para muita gente e outras cousas mais. Meu pai, que com cerca de sessenta anos ‘veraneou’ pela primeira vez, ficava que nem criança dentro do mar. Era para ele o máximo ‘tomar banho de mar’. Claro que ouvi muitas repreensões de minha mãe a meu pai, que estava sempre temerosa que alguém pudesse se afogar. É desse período que o controle da velocidade era feito pela entrega de folheto, em Gravataí, com o carimbo de um relógio que indicava a hora permitida de passagem no posto de Santo Antônio da Patrulha. A frase motivadora era: “Perca um minuto na vida, mas não perca a vida em um minuto!’

Minha terceira fase de praia podia chamar-se ‘Santa Terezinha’. Conheci essa praia em janeiro de 1966, quando fui pivô de uma quase tragédia. Saíramos cedo de Porto Alegre. Transportava em meu Gordine 65, meu primeiro carro, lotado de malas para uma temporada, a Dione, minha namorada e futura mãe de meus filhos, a Dona Norma, sua mãe e mais irmãs da Dione. Quase chegando à Tramandaí, colido o carro no canteiro que havia no meio da pista, na frente do terminal da Petrobras. Foi uma capotagem de consequências que não quero evocar. Mesmo causador desse acidente, naquele veraneio, pedi para o seu Ivo, pai da Dione, licença para noivarmos em março e casarmos em outubro; o que de fato ocorreu, respectivamente em 25 de março e 29 de outubro de 1966.

Santa Terezinha, que iniciou tão trágica foi minha praia nos 20 anos de meu primeiro casamento. Ainda não tínhamos filhos, mas já éramos donos de uma casa enterrada nas dunas, para a qual a água era conseguida por bombeamento manual. Recordo que 1969, quando o Bernardo tinha algumas semanas já fomos para a praia, tendo a companhia de meus pais. Devemos ter ocupado aquela casa por quase 10 anos, que mereceu uma reforma que a fez emergir das areias. Achei uma foto de então. Nela estou com o Bernardo e o André.

O cabelo é da época, talvez 1974, nas areia que circundavam a casa. Tempos depois construímos uma casa melhor, a uma quadra do mar, no outro extremo de Santa Terezinha. A cada veraneio nos mudávamos para a praia logo depois do natal e se ficava até março. Quando eu não estava de férias, ia aos fins de tarde de sextas-feiras e voltava na noite de domingo ou na manhã de segundas-feiras. Vi meus filhos crescerem nas gostosas férias passadas em Santa Terezinha, onde tínhamos amigos que entrávamos apenas no período de veraneio. É deste período o acompanhamento da implantação da ‘free-way’ e das disputas entre o Bernardo e o André sobre que pagaria o pedágio.

Minha quarta fase de praia chama-se ‘Atlântida’ e tem como marca a primeira metade de minha história com a Gelsa. A Liba tem uma bela casa naquela que é tida como a mais sofisticada das praias gaúchas. Muito a fruímos. Recordo que logo começamos (25ABR87) foi lá que estávamos em agosto de 1987 lendo poemas de Carlos Drummond de Andrade, quando recém se anunciava sua morte. Lá foi muitas vezes refúgio quando as lides quase nos fazia soçobrar. Depois, a cada verão tínhamos conosco as quatro meninas (Laura, Ana Lúcia, Clarissa e Júlia) no período que nos cabia no rateio familiar. Usualmente alternávamos esse período com um período na Pousada do Serrano em Gramado, onde tínhamos duas cotas. Quando as meninas cresceram, abandonamos uma e outra prática (praia/serra). Também de Atlântida tenho muito gratas recordações de temporadas que ali passamos com a Liba. Será bom hoje voltar para lá e encontrá-la na sua casa. Será mais uma de nossas viradas de ano nesta praia.

Assim com os votos de uma excelente quarta-feira, o convite para nos lermos amanhã desde Atlântida. Ou desde ‘as praia, depois de tomar um banho de mar’ como diria meu pai.


Fórum Social Mundial em Porto Alegre de 25 a 29 de janeiro de 2010.

6 comentários:

  1. Muy querido Mestre Chassot,
    Lindas sus evocaciones y curioso que por lo menos tengamos eso en común a pesar de las diferentes latitudes: acá también comienza la época de playa.
    Por otra parte, Guayaquil está inundada de una tradición muy ecuatoriana para celebrar el fin de año, se trata de los "Años Viejos", muñecos con figuras humanas u otras para representar lo más importante que ha ocurrido durante el año que acaba (encabezando a políticos, por supuesto, pero también jugadores de fútbol, periodistas, actores, personas que hacen historia desde la visión popular).
    Si se anima, mire en el link del diario El Universo una nota sobre esta tradición: http://www.eluniverso.com/2009/12/30/1/1445/guias-recorrer-viejos.html?p=1354&m=638
    A las doce de la noche del 31, antes de quemarlos en grandes hogueras con fuegos artificiales, se lee el testamento del Viejo: una evaluación de lo que ha hecho y el legado que deja, las promesas y esperanzas para el futuro.
    Le deseo a usted y a todos los lectores de su blog un maravilloso fin de año y que el próximo 2010 esté lleno de bendiciones,

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  2. Estimado Matilde,
    acabo de me ‘instalar na praia’ e recebo teu tão atencioso comentário.
    A viagem foi tranqüila e chegamos com uma chuva de verão.
    É impressionante o movimento que há aqui. Filas enormes no comércio. Todavia a maior dela são nas casa lotéricas para se fazer apostas em uma loteria da virada que deve pagar o maior prêmio da história do Brasil.
    Quando agradeço teu comentário sou grato também por teus votos aos leitores deste blogue e para mim.
    Aproveito para desejar a ti e aos teus, muitas alegrias nos dias de festas que vivemos e que 2010 – um ano 10 – seja pleno de realizações, às quais associemos juntos redobrados cuidados com o Planeta.
    Um afago com carinho,
    attico chassot

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  3. Olá professor!
    Sempre gosto de ler esses "relatos de memórias". É um movimento interessante, recorrer a épocas tão boas em nossas vidas.
    Lendo o seu post e o seu comentário, fico imaginando o agito da praia. E bate uma vontade de estar no meio da multidão. Um sentimento estranho, mas gostoso. Porém esse ano, devido ao trabalho, optamos por ficar na serra, transitando de nossa cidade Ivoti, Pres. Lucena e Nova Petrópolis, diga-se belas cidades para um bom descanso.
    Abraço e um 2010 iluminado para você e sua família.

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  4. Mestre Chassot, sua blogada de hoje remonta a uma tradição antiga, onde o "encontrar-se com a natureza" era um rito de purificação. Assim, muitas pessoas embrenhavam-se em florestas, subiam aos gélidos cumes das montanhas, ou iam até a praia, para entrar em contato com a vida sempre ativa e imprevisível do mar. Ainda hoje, tais hábitos são comuns, pois quem de nós pode dizer que jamais foi à praia, a serra ou ao interior? Os tempos mudam, mas as tradições se fortalecem.
    Ainda na contagem regressiva para o início de um ano 10, seguem os votos de um ótimo dia.

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  5. Muito estimado colega Luís,
    parece que tua opção é um pouco mais sábia. Realmente o rebuliço de pequenas cidades se convertendo em superpopulações é ‘agobiante’. Obrigado por teu comentário e cumprimentos pelo teu blogue.
    Desejo que novo ano seja prenhe de Paz e Amor e de muito sucesso profissional.
    A admiração do
    attico chassot

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  6. Meu caro Marcos,
    e 2009 agoniza. Te escrevo desde Atlântida no quase ocaso da antevéspera do promissor 2010. Não sei se isso que fazemos hoje: ‘ir para às praias’ significa reencontro com a natureza. Nossas cidades balneários ficam desagradáveis ante o imenso afluxo de veranistas. É verdade que não deixei de me emocionar no anoitecer de hoje em me reencontrar com o mar. Caminhei dentro das águas e senti-me muito feliz.
    Assim, retemperado pela maresia meus votos de um bom ‘dia de São Silvestre’.
    A amizade e a admiração do
    attico chassot

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